sábado, 31 de dezembro de 2005

O ACROBATA PEDE DESCULPAS, MAS NÃO CAI

Isso não existe mais

Foi-se o tempo em que a felicidade era um bem a ser alcançado coletivamente. Foram-se as grandes greves em nome dos oprimidos, foi-se o sonho de um socialismo socialista, foi-se a social-democracia. O que vale é tudo aquilo que está na Veja e quem não concordar é retrógrado ou extremista. Os maiores nomes da política hoje são burocratas que precisam de assessores até para fazer a própria barba. Pergunte a Tony Blair qual era a cor do cavalo branco de Napoleão e terás uma resposta vaga através da secretária dele de número 4. Os grandes nomes políticos de outrora que sobreviveram enfiaram a cabeça na privada do establishment e o rapaz da foto acima está aí para não me deixar mentir. Trinta milhões de pessoas beijaram o Sapo Barbudo em 2002 e ele não virou príncipe porque preferiu deixar tudo como está há 506 anos. O importante é desideologizar nossas atitudes, disse ele em entrevista recente. Logo ele, o porta-vez da ideologia de toda uma geração, esta que agora se enxerga como mais uma em meio a tantas outras perdidas.

Aprendemos a nos acostumar. Nos acostumamos com os barracos no fim da avenida e hoje nem nos assutamos por terem se transformado no Jardim Irene. Nos acostumamos com a impossibilidade de fazer greve para aumento de salário. Greve é selvageria exótica, virou o dragão-de-komodo das relações trabalhistas. Nos acostumamos com tudo. Eu me acostumei com os seis pedintes que circulam entre a Angélica e a Paulista que antes não existiam. A nossa praga é nos acostumar.

A tolerância virou uma faca de dois gumes. Se hoje comemoramos os umbandistas e os gays, também assistimos ao fenômeno da tolerância do lixo. O funk carioca deve ser tolerado porque é um fenômeno social e cultural das favelas, já diria um desses sociologozinhos de merda, e não encarado como um retratado da degradação vividas por quem vive no morro. Então tem-se o funk como algo positivo e não como um pedido indireto de socorro por quem agoniza na latrina social da periferia brasileira.

A felicidade coletiva nunca existiu. Passamos o século XX achando que um dia ela poderia existir, mas ela não existirá. O conceito de felicidade hoje, como quase tudo nessa vida de século XXI, é individual. A ela só restou me acostumar.

Me acostumei. E dentro deste contexto, não tenho do que reclamar. Estou cercado das pessoas certas. Às vezes é bom demonstrar aos amigos o quantos eles nos acrescentam. Não há o sindicato, não há o partido, não há a Igreja. Tudo que há é o legado que você deixa entre os seus e o legado que os seus deixam em você. É por isso que apesar de toda a torcida contra que carrega os parágrafos acima, ainda assim 2005 foi um grande ano. A todos os 10 ou 15 grandes amigos que carrego comigo fica aqui o agradecimento. Se o universo vai de mal a pior, nosso microcosmo continua sensacional. O mundo foi estreito para Alexandre, um desvão no telhado é o infinito para algumas andorinhas.

domingo, 18 de dezembro de 2005

A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR

- Gorda, Gorda!!!! Quem foi que desenhou caralhinhos voadores na parede do banheiro de nosso lar??????

quarta-feira, 14 de dezembro de 2005

quarta-feira, 7 de dezembro de 2005

DE MÚSICAS, AVESTRUZES E TRILOBITAS

O universo era uma casca de noz naquele início de anos 80. Ao menos lá em casa. Se o pau comia lá fora com Figueiredo e Niltão Cruz, no quintal de casa quem falava era eu e tava falado, não tinha discussão. Não.

Tenho de música o que provavelmente tenho de vida. Lembro de correr pela casa no sábado à tarde vendo o meu pai ligar o então Technics, o mais poderoso long player da época, com um copo de cerveja na mão. Eu não tinha mais que 4 anos e brincava no quintal sozinho acompanhado pela voz de Maria Creuza, Luiz Ayrão e Noite Ilustrada.

Mas ninguém sabe mais quem foram Maria Creuza, Luiz Ayrão e Noite Ilustrada.
E, por um momento, nem eu.

A partir dos 13 anos, o meu lado avestruz tomou conta da casa, fez o que vem quis e saiu. O avestruz é o bicho que engole qualquer coisa. E lá fui eu ser fã de Roxette. Meu Deus, o que é o Roxette. Crash Boom Bang. Todos os meus amigos ou gostavam de música Dance - versões batistaca de músicas famosas, ao ponto de lançarem o álbum Beatles Dance - ou se vestiam de preto para cultuar a Trilobita Music: Metallica, Guns and Roses, Type O Negative. Trilobita foi um ancestral do homem moderno caracterizado pela boçalidade. Algo como deixar os cabelos cumpridos e fazer cara de mau para compensar as espinhas.

Mas não culpo a nós, avestruzes e trilobitas, já que ouvíamos o que os avestruzes e trilobitas do rádio nos ofereciam, que por sinal cultuaram outros propagadores de avestrulices e trilolbitices, e assim em uma cadeia que é tão óbvia quanto injusta e triste.

Injusta porque eu deixei de ouvir uma quantidade inenarrável de coisas boas que não chegaram até os ouvidos da minha geração. Triste porque todo esse material está fadado aos mofos, felizardos mofos que consumirão os discos antigos de gente como meu pai.

Movido pela pura curiosidade - e talvez um tiquinho de nostalgia - ouvi os discos de meu pai, agora com os ouvidos melhor preparados do que há 20 anos. Há anos comecei, com intensificação maciça nos últimos meses. Foi a coisa mais sensata que fiz nesses 24 anos e 9 meses de existência. O Kazaa foi conseqüência.

O por quê de tudo isso agora, neste blogue que dispõe a bazófia frente a tudo?

Por acaso, muito por acaso, achei uma música absolutamente simples. E bela. Cicatrizes, do Miltinho, cantada pelo MPB 4 em versão de 1972. E me bateu uma tristeza em saber que essa é só mais uma das tantas melodias que eu, se o acaso não me ajuda, não ouviria jamais.
Sou fã de rock e roqueiro por excelência. Mas chupem o rock. Chupem os Beatles, chupem o Bob Dylan. O momento é de reflexão. Porque por melhor que seja o rock, ele não chega aos pés da sonoridade e simplicidade e genialidade do samba.

Para o diabo com o Elvis. Eu fico com os meus:

- Cicatrizes, MPB4
- Partido Alto, Chico Buarque
- Silêncio de um Cipreste, Cartola
- Dança da Solidão, Paulinho da Viola
- Luz Negra, Nelson Cavaquinho (com a Beth Carvalho é a melhor)
- Canto de Ossanha, Vinícius e Baden Powell (melhor com Maria Creuza, Vinícius e Toquinho)
- Naquela Mesa, Nelson Gonçalves
- Andança, Beth Carvalho
- Samba Quadrado, Milton Carlos
- Sonho de um Carnaval, Chico Buarque
- O sol nascerá, Cartola
- Tristeza, pé no chão, Clara Nunes
- Marcha da Quarta-feira de Cinzas, Carlinhos Lyra (com Toquinho e Vinícius é bem melhor)
- Feitio de Oração, Noel Rosa - com Maria Bethânia, mas melhor com Nelson Gonçalves)
- Pecado Capital, Paulinho da Viola
- O sol nascerá, Cartola
- Quando o carnaval chegar, Chico Buarque
- Folhas Secas, de Nelson Cavaquinho, com Beth Carvalho
- Berimbau, Vinícius e Baden Powell
- Ela, Germano Mathias
- Samba de Orly, Chico Buarque, Toquinho e Vinícius

quinta-feira, 1 de dezembro de 2005

NÃO EXISTE PECADO DO LADO DE CIMA DO CÍRCULO POLAR

Típico exemplar de um japa coreano habitante do Ártico

Existe um vasto e intrigante repertório de lendas a respeito dos povos que vivem ao norte do Alasca, Canadá e Groenlândia. São aqueles japoneses bêbados avermelhados que moram em iglus e que usam os cachorros como meio de transporte. Ou seja, por lá o Ipiranga-Lapa late e rosna, embora provavelmente empaque menos.

Uma das lendas é o apego que os esquimós têm à 3ª idade, eufeminada por aqui de "Melhor Idade" e possivelmente chamada na Groenlândia de "Bobeô a gente pimba". Pra cima do Ártico, parece que o sujeito que passa a casa dos 70 anos e anda meio chumbadão, os mais chegados o levam até os cafundós da neve e lá o deixam morrer congelado. Motivo: ele não teria mais função no meio em que vive. Como diria o Bill Gates naquela propaganda: "Why didn´t my bank think of that?" Eu mesmo faria isso com as cinco ou seis velhinhas que todos os dias me alugam no elevador pra dizer o quanto eu sou grande, que qualquer dia me chamam pra trocar a lâmpada da cozinha ou que me perguntam se tá muito frio aqui em cima.

Imagine só que maravilha essa situação:

- Professor Erasmo, por gentileza, queira me acompanhar até aquele precipício...

***

Dizem também que um sujeito que vive na neve é capaz de distinguir 17 tonalidades diferentes da cor branca. Isso se deve ao fato dele só enxergar um ambiente branco o tempo todo, o que desenvolve a capacidade de adaptação. Conclui-se que para esse sujeito um caleidoscópio provavelmente teria efeito alucinógeno. Jogue-o numa piscina de cocaína que ele lhe desenhará histórias em quadrinhos.

Outra: o esquimó é, antes de tudo, um corno. Todo homem que visita a choupana de um esquimó é convidado pelo próprio a manter relações carnais com a mulher dele. O pobrema: o concurso de Miss Esquimó costuma terminar em zero a zero. Dizem que o iéte é na verdade uma mulher groenlandesa, mas isso nunca ninguém confirmou. Além da maledicência física, há o detalhe de que os esquimós se utilizam de uma mesma roupa costurada ao corpo para todo o inverno, que costuma durar 363 dias por ano, um pouco mais em ano bissexto. Isso possivelmente transforma as axilas das moças em uma fauna amazônica com cheiro de pomarola. Pelo que me lembre, encarei coisa parecida no carnaval de 1998, mas não pretendo repetir a dose.

Não adianta. Eu tento, mas nunca vou conseguir entender a cultura alheia. É por isso que eu bebo.

segunda-feira, 28 de novembro de 2005

UMA TROCA DE E-MAILS DESPROVIDA DE SENTIDO

-15: 08 - LANÇAMENTO LIVRO PROF. SIDNEY

- 15: 08 - Re: INÉDITO! PROF. SIDNEY LANÇA LIVRO

- 15: 18 - MENTIROSO, PROF. SIDNEY LANÇA LIVRO

- 15: 26 - Re: QUEM MEXEU NO LANÇAMENTO DO PROF. SIDNEY?

- 15: 40 - LANÇAMENTO: LIVRO PROF. SIDNEY E A SRTA. PRYNN

- 15:56 - Re: LIVRO LANÇA PROF. SIDNEY

- 16:07 - PROF. SIDNEY LANÇA LIVRO EM SIDNEY

- 17:04 - Re: VOCÊ NÃO PODE LANÇAR LIVROS DO PROF. SIDNEY COM TANTA FREQÜÊNCIA!

- 17:34 - BAD BAD PROF. SIDNEY. NO DONUT FOR YOU

- 18:13 - AO ENTRAR NESTE LIVRO, VERIFIQUE SE O PROF. SIDNEY ENCONTRA-SE LANÇADO NESTE ANDAR

- 18:19 - THE PROF. SIDNEY CANNOT BE DISPLAYED

- 18:20 - NÃO JOGUE PROF. SIDNEY NA GRAMA

- 01:36 - Re: GARÇOM, TEM UM PROFESSOR SIDNEY NA MINHA SOPA...

(not to be continued)

quinta-feira, 24 de novembro de 2005

O GLAMOUR PRECEDE A CRIATURA

Sobre um sujeito chamado Alberto Hurtado, jesuíta de missões chilenas do século passado:

"Em 1915, ocurre un hecho que marcará su vida: toma como director espiritual al padre Fernando Vives, cuya influencia seguirá hasta su vida adulta; la mantendrá por carta cuando el Padre Vives se vaya de Chile tres años más tarde. Él le ayudó a amar a Dios sirviendo a quienes sufren. En una dedicatoria, años después, Alberto habla del padre Vives como 'a quien debo mi sacerdocio y mi vocación social'."

"En 1931, regresó al país (Chile) el padre Fernando Vives, con quien Clotario Blest fundó la Liga Social de Chile, que dió un nuevo impulso a la difusión del ideario socialcristiano."

Conheça mais sobre o O Humanismo de Fernando Vives.

sábado, 19 de novembro de 2005

DA EFICIÊNCIA CORPORATIVA

Você só pode se achar um imbecil ao notar que foi conversar com sua chefe na mesa dela sem ter lembrado de fechar o cinto da calça.

terça-feira, 15 de novembro de 2005

A VERDADEIRA HISTÓRIA DO GUERRA NAS ESTRELAS

"José Sarney, o senhor está verde... e tirou o bigode!"

Eu tento, juro que tento entender certos mistérios do homem humano. São as perguntas sobrenaturais que a razão não responde. Há vida após a morte? O Paraíso existiu mesmo ou Adão e Eva eram um casal de australopitecos? Será mesmo que derrubei pinga no meu diploma da Cásper depois de voltar do Ibotirama naquela noite?

Uma das questões que me devoravam é como as pessoas podem ser fãs de Guerra nas Estrelas. Mas eu decifrei-a esta noite. Veja bem, uma coisa é gostar da coisa, outra é ter palpitações pélvicas ao ver uma espada rosa-choque. É desta última categoria que eu quero saber. Para compreender a questão, acabo de desperdiçar duas horas ao telefone entrevistando uma fã incondicional da trilogia, que me contou como o cara da capa preta se transformou no cara da capa preta. Assim, eu poderia saber se de fato o enredo é tão atraente assim.

Incubo-me de resumir o que ouvi.

Existia uma princesa com cabelo preso no formato "chifres de carneiro" que era também senadora. Nunca vi uma princesa senadora, mas tudo bem, qualquer dia a gente leva a Heloísa Helena no Um dia de Princesa do Netinho e estamos aí com a verdade factual. Pois bem, essa princesa senadora tinha um nome estranho que já me esqueci. Batmi. Não, era Padmi. Cádmio, é isso. A Princesa Cádmio era apaixonada por um cocotão eleito pelas mulheres chamado Anaquem? Skywalker (traduzindo: andarilho do céu, ou seja, um Turu com milhagem da Varig).

Ele era treinado por um cara que, desconfio, era chegadão nele, um tal de Empadawan, que parece nome de jogador da Arábia Saudita da Copa de 94. Anaquem? Skywalker briga com esse cara, que fala umas coisas hostis dele pra Princesa Cádmio. Anaquem? então vai ter com ela, mas no caminho mata umas criancinhas, estupra umas velhinhas e come um yaksoba na Paulista.
Tem a cereja do bolo: a Princesa Cádmio está grávida de gêmeos. Então o Anaquem? chega nela cantando Roberto Carlos: "Eu te darei o céu meu bem, e o meu amor também", o que quer dizer que ele convida a dita cuja para conquistar o universo e 24 territórios a sua escolha. Influenciada pelo jogador da Arábia Saudita - o tal de Empadawan que é apaixonado pelo Anaquem? - a Princesa Cádmio se recusa. Não por ele ter matado umas criancinhas ou estuprado umas velhinhas, mas sim por ter comido o yaksoba da Paulista, que, convenhamos, é mesmo um tanto disgusting.

Aí o Empadawan parte pros finalmentes e corta os braços e as pernas do Anaquem? Skywalker (Adendo: se o filme fosse politicamente correto, a partir deste momento o sujeito deixaria de se chamar Skywalker. Fecha adendo). Então enfiam o que restou do pobre coitado e o entalam naquela armadura com a capa preta. A Princesa Cádmio fica tão triste com o desenrolar da trama que acaba morrendo de tristeza. Ou seja, houve aí um plágio do Camilo Castelo Branco.

Pelo que entendi, ela morre sem dar a luz aos gêmeos, o que deve ter sido bom. Se eles nascessem, além de gerar mais uns três filmes insuportáveis, dada a qualidade obtusa do material relatado, provavelmente eles seriam os substitutos dos Gêmeos do H. Como diria o sociólogo Luciano Huck: "Loucura, loucura!".

Conclusão: não vela um piparote. Agora me dê licença que tá começando um filme do Bud Spencer e do Terence Hill.

quarta-feira, 9 de novembro de 2005

A PÁTRIA DE FRALDÃO

"Me dá! Me dá batata!"

Se perguntassem ao editor de SorryPeriferia há uma semana o que exatamente é a luta de sumô, teriam como resposta:

- Duas baleias amarelas que se chocam até que uma delas exploda. É quando aquele que não explodiu é declarado campeão, o que garante a ele ingresso grátis no La Buca Toquiense, de onde ele sairá apenas para a próxima luta.

Em verdade não é nada disso, mas não serei eu que explicarei a marmanjos o que exatamente é uma luta de sumô (tá. eu também não sei). Mas as curiosidades em torno do bagulho é que são pitorescas. Listemos em tópicos:

- O objetivo do sumotori (aquele que luta sumô) não é, como no caso do Vale-Tudo, deixar a cara do adversário similar à de um pit-bull. Basta conseguir empurrar o oponente para fora do círculo em que estão lutando, que é feito de palha de arroz. Só isso já tornaria o espetáculo mais simpático não fosse a presença solitária e deselegante dos fraldões, o que não raras vezes deixa as vergonhas dos pequenos a balançar freneticamente, traumatizando as criancinhas que estão assistindo a disputa.

- Todo lutador de sumô é ídolo no Japão, e disso eu já sabia. O que não sabia é que eles casam com as mulheres mais bonitas, as modelos e as misses do país. O princípio de uma modelo é ser magra; modelo japonesa, então, é uma tábua de passar roupa atrofiada. O coito entre ambos é algo que deixarei para a imaginação do nobre leitor.

- Além de catar as cocotinhas, os yokosuna (equivalente à faixa preta) são os principais garotos-propaganda do Japão ao lado do David Beckham, depois que deixam os ringues.

- Um sumotori famoso, um havaiano de nome Konishiki, aposentou e virou apresentador de programa infantil. Sucesso absoluto. Eu vi uma foto do programa, e é rigorosamente grotesco. Imagine o cenário do Bozo. Agora imagine um sujeito muito muito gordo, como é o caso desse havaiano, pelado deitado de lado, com a mão direita a segurar a cabeça. Imagine também três ou quatro criancinhas ao redor dele, prestando atenção nas historinhas que ele conta e o ouvindo chamar os desenhos animados. É por aí.

- O maior yokosuna desde os anos 60 luta atualmente. É um mongol de nome Asashoryu, que pesa apenas 145 quilos. O cara ganhou meu respeito quando venceu a última etapa, virou um balde enorme cheio de saquê e saiu dando gargalhadas, já bêbado. Ele é considerado o Mike Tyson do sumô, pois já tem uma folha corrida de vexames extra-ringues, como encher a cara num boteco e quebrar tudo a seguir.

- A maior parte dos yokozuna não são tão altos e pesam talvez perto de 200 quilos. Lógico: para encarar um adversário de frente e empurrá-lo, é necessário uma grande avant-garde. Por serem excessivamente gordos, dificilmente os sumotori vivem mais de 40 anos.

segunda-feira, 7 de novembro de 2005

HUMANOS, DEMASIADO CANINOS


- As pessoas egocêntricas não conseguem entender que o restante da humanidade é assustadoramente mais interessante do que elas mesmas.

- Entrevista com um economista britânico de linha keynesiana na Globonews cujo nome fico devendo, dia desses à tarde. Ele tecia elogios ao sistema escandinavo que permite ao empregado trabalhar menos horas do que no resto do mundo. O repórter, sujeito com pinta de workaholic e um tanto incomodado com as respostas, declarou que é notório que todo o sistema de trabalho escandinavo é pouco competitivo e acarreta prejuízos para a empresa. A resposta: "Você disse bem, o prejuízo é para a empresa e não para o indivíduo. Em vez de se matar para trabalhar, o funcionário dedica sua mente para algo mais nobre e útil. À literatura, aos filhos, a uma corrida no parque. Essa é razão de viver". E Roberto Marinho sorriu feliz em seu ataúde.

- "Ninguém entende a alma feminina como o Chico Buarque" é o maior clichê que alguém com cromossomos XX pode repetir, por mais que seja verdade.

- Se o País das Maravilhas fosse Jundiaí, Alice teria se casado aos 16 anos com um dono de posto e hoje comentaria a redenção de Tião em América com a vizinha do 102.

- No fundo eu compreendo o Presidente Bush. Ele é modesto quanto a sua própria falta de talento enquanto ser humano.

- Todo narciso acha feio o que não é espelho e cita Caetano Veloso para dar uma de bom.

- Pode dizer que sou feio. Se sou ou não, posso melhorar. E você que votou no Serra?

- Agora diga tchau, Lilica. - Tchau, Lilica!

sexta-feira, 4 de novembro de 2005

ECOS DO ALÉM

O destino sorri aos afortunados, diz o ditado. Eu completaria dizendo que o Além manda SMS.

Foi o que ocorreu comigo esta semana. Enquanto jantava na glamourosa sala de jantar de meu lar - que só possui a TV, estante, um cone da polícia e uma placa onde se lê "Valentina Karan aluga", roubada da Paulista - ouvi um toque no meu celular. Era uma mensagem. As pessoas não costumam me mandar mensagens de celular. Algo estava errado. A mensagem proveniente de um número que não constava na minha lista dizia exatamente o seguinte:

- O q vc quer?

Parei, olhei e limpei um pigarro imaginário. Um comichão bateu-me entre o fígado e a alma. Como assim o que eu quero? Só podia ser uma mensagem do Além. Parece início daqueles remakes de filmes de terror japoneses estúpidos que Hollywood costuma fazer.

Confesso que não respondi na hora porque não tinha crédito. Mas depois devolvi a gentileza:

- Eu quero uma porção de manjubinha, dois chopes e o seu sorriso. Benzinho.

Ainda aguardo réplica ou vingança do post-mortem. Voltamos a qualquer momento com maiores informações sobre o assunto.

terça-feira, 1 de novembro de 2005

QUATRO GRANDES LIDES DA MÚSICA BRASILEIRA

Moreira da Silva, the guy

Músicas que têm como introdução um monólogo ou diálogo absolutamente único, tanto para o bem quanto para o mal. É claro que haverá quem torça o nariz para a segunda e a quarta. Mas é tão ruim que é bom. O Sublime de Kant, porcamente representado.

1)

- Ô Morangueirá... você passou no teste da farinha?

- Ah rapaiz... sentei e tava tudo bem, tudo certinho! Aqui só tem saída, entrada necas. Never!

Doze Annos, Chico Buarque e Moreira da Silva (1977-78).

2)

- Oi Celly!

- Oi Tony!

- Você vai ao baile esta noite?

- Claro que vou!

- Com quem? Posso saber?

- Com Pedro Álvares Cabral!

- Como?! Você ficou biruta?

- Não, esta noite eu vou estudar História!

Eu não tenho namorado, Tony e Cely Campello (1961)

3)

- Etelvina, minha filha!

- Que é que há, Jorginho?

- Acertei no milhar
Ganhei 500 contos
Não vou mais trabalhar,
E me dê toda a roupa velha aos pobres
E a mobília podemos quebrar:

Isto é pra já, passe pra cá (simulando o barulho de quebrar a mobília)

Acertei no Milhar, Wilson Batista e Geraldo Moreira, 1940. Com Moreira da Silva ou Jorge Veiga.

4)

- Atenção, Creusebeque! Creusebeque, meu filho, vai começar a baixaria.

Mundo Animal, Mamonas Assassinas, 1995.

quinta-feira, 27 de outubro de 2005

Eis quando você vira referência em futebol. Não que você saiba demais sobre o assunto mas simplesmente porque trabalha com ele o que significa que você só fala disso, respira isso e não tem outra utilidade na vida a não ser responder questões sobre futebol, óbvio. São 11 horas por dia em média lendo, escrevendo e editando sobre onze homens, uma bola e eventualmente um juiz ladrão. Aí, fora do expediente, muitos de seus amigos te procuram exclusivamente para falar de... futebol. Os seus familiares vêm falar com você sobre... futebol. Até os amigos dos seus pais te procuram para saber o paradeiro daquele maldito lateral-direito que jogava na Portuguesa no Campeonato Paulista de 1989 e que marcou aquele gol contra o XV de Jaú naquele jogo apitado pelo Dulcídio Wanderley Boschilla, não lembra? Como não? Você trabalha com isso, tem que saber, porra!

Aí você chega no bar com os amigos que você não vê há séculos e passa 90% do tempo respondendo sobre.... futebol. Ah, esse estapafúrdio costume de ser solícito. Eis quando você repara naquela moça que pouco fala com você levantando os olhos como se dissesse "Mas que cara chato esse, que só fala de futebol", enquanto outro sujeito com nariz de fuinha que você pouco viu na vida fica indignado porque não sabia que o Tcheco voltou para o Al Itthad da Arábia Saudita, você não sabia? Como não? Você trabalha com isso, tem que saber, porra!

Aí você se dá conta do quanto começa a se tornar uma pessoa desinteressante porque não é associado a nada além do maldito ludopédio que não entrou para a História como ludopédio e sim como futebol. E no domingo à noite, enfim, aquelas poucas horas de paz que você reserva exclusivamente para se trancar solitariamente numa sala de cinema por duas horas e sair mais leve com a cabeça em Plutão, ou então ler metade daquele livro que você pretendia ler em 10 dias e que não consegue terminar há um mês porque o que resta de você ao fim do dia não consegue fazê-lo. É quando você é cobrado por não estar em casa assistindo o Avallone com seu cabelo acaju narrar o Gol Ypioca da semana e todas as outras discussões sobre os intermináveis pênaltis que os juízes ladrões não deram, os zagueiros burros que marcam a bola em vez de marcar o adversário e o presidente do Atlético Paranaense que tomou outra suspensão porque é um boçal que só fala bosta assim como você que não está assistindo isso, como não, você trabalha com isso, tem que assistir, porra!

Vamos para o Lelis? Vamos ao La Buca? E o Caio Tulio, hein? Arlequinal! O brasileiro morre de fome gritando gol. Eu continuo sem fome apertando o foda-se.

terça-feira, 25 de outubro de 2005

Fato: conheço pelo menos três jornalistas da Folha de S. Paulo que não cheiram cocaína. Deixem o jornal do Tavinho em paz, pô.

quinta-feira, 20 de outubro de 2005

O SOL NASCE PARA TOLDOS

Elegância mesmo é descobrir qual filme bizarro da Mostra 2005 combina com você. Como diria o antropólogo Januário de Oliveira: "É disso que o povo gosta, Adisson Coutinho!".

ARROZ DEMAIS - Li Honqq (China, 2005) De repente, durante uma brincadeira de esconde-esconde com sua mulher, Mao resolve abandonar sua casa. Muda-se para a casa de Xiao Ri, um conhecido. Os dois iniciam uma rotina de estranhos encontros amorosos e procuram formar uma espécie de família. Não há explicações lógicas para o estranho comportamento dos dois homens.

DESEQUILÍBRIO - Francisco Garcia (Brasil, 2004) Um equilibrista, metáfora do homem contemporâneo do século XXI, se relaciona oniricamente com os sonhos de uma prostituta. Pelas geometrias da cidade de São Paulo, a grande metrópole terceiromundista, eles caminham e mostram suas relações com a contemporaneidade.

ALÉM DO AZUL SELVAGEM- Werner Herzog (EUA 2005) Um extraterrestre amargurado natural de um planeta submerso na água conta a derrota de seu povo quando veio à Terra muitos anos atrás, na tentativa de conviver com os seres humanos. Nesse meio-tempo, um grupo de cientistas, que havia partido há 15 anos para uma missão, retorna em um túnel do tempo e aterrissa na Terra 820 anos depois. Depara-se com um planeta totalmente deserto, de volta ao seu estado de vegetação natural. Cenas submarinas e várias imagens reais de missões da NASA no ônibus espacial, bem como declarações de verdadeiros cientistas da NASA, provocam no filme uma sensação de vertiginosa imersão filosófica e existencial.

TRANSAMÉRICA - Duncan Tucker (EUA, 2005) Bree, cujo nome de batismo é Christian, é uma transexual de Los Angeles. Ela economiza cada centavo para fazer a última operação que a transformará definitivamente em mulher. Um dia, ela recebe o telefonema de Toby, um rapaz preso em Nova York, que está à procura do pai. Bree acha que ele pode ser fruto de algum relacionamento que teve quando ainda era homem. Ela viaja até Nova York e tira o rapaz da prisão. Toby acredita que ela seja uma missionária cristã interessada em convertê-lo. Bree não desfaz o mal-entendido e o convence a acompanhá-la até Los Angeles.

DO MUNDO NADA SE LEVA - Charly Braun (Brasil, 2005) Um adolescente compra um aparelho de vídeo usado e vê toda a sua vida mudar. Com isso, um futuro sombrio lhe é revelado e ele não tem como impedir as forças do destino.

NAVARASA - Santosh Sivan (Índia, 2004) Swetha é uma garota de 13 anos que descobre que seu tio tem uma vida secreta: toda noite, ele se veste de mulher. Quando a sobrinha o questiona, ele foge e vai para um festival anual numa pequena cidade da Índia.

IMPULSIVIDADE - Mike Mills (EUA, 2005) Justin Cobb aparenta ser um típico adolescente, exceto pelo detalhe de nunca ter conseguido parar de chupar o dedo. Aos 17 anos, após ter tentado de tudo para se livrar do cacoete, ele resolve o problema por meio da hipnose feita pelo seu dentista, que gosta de bancar o psicólogo. Após a sessão, Justin para com o vício mas continua compensando suas frustrações pela boca, consumindo todo e qualquer tipo de droga.

JOHANNA - Kornél Mundruczó (Hungria, 2005) Johanna é uma viciada em drogas que sofre uma overdose após roubar morfina de um hospital público húngaro. À beira da morte, é ressuscitada e mantida no hospital disfarçada de enfermeira, graças ao médico responsável, que se apaixona por ela e não a quer nas ruas de novo. Depois da experiência, Johanna passa a experimentar uma misteriosa e inusitada capacidade de cura: fazer sexo com os doentes, livrando-os magicamente de seus males. Só não faz amor com o médico que a salvou, pois ele não está doente. O médico, indignado com a situação, promove uma guerra contra ela. Mas os pacientes, gratos, juntam forças para protegê-la.

LEMMING - INSTINTO ANIMAL - Dominik Moll (França, 2005) Allain Getty é um engenheiro obcecado por tecnologia e controle que chama seu patrão e esposa para jantarem em casa. No meio do preparo dos pratos, um incidente complica tudo: a pia está entupida por um obstáculo invisível. O pior está por vir. Os convidados chegam atrasadíssimos e provocam um pequeno escândalo. Um suicídio, uma traição e o resgate do obstáculo que entupiu a pia - o "lemming" do título, um raro roedor da Escandinávia que ninguém desconfia como foi parar ali - criam uma atmosfera diabólica, em que tudo pode acontecer.


ALMA MATER - Álvaro Buela (Uruguai 2005) Pamela é uma caixa de supermercado tímida e solitária. Aos 34 anos, suas únicas atividades sociais são visitas diárias à mãe autista no hospital e as idas ao templo evangélico de um pastor brasileiro. Sua vida insignificante muda completamente quando começa a receber estranhos sinais, que acredita serem divinos. Pamela enxerga mensagens de Deus em tudo: nos sonhos, nos códigos de barra, nos clientes e na própria mãe. Virgem, ela passa a crer que tenha sido escolhida para ser a mãe da nova encarnação do Cristo.

DEVAKI - Bappaditya Bandopadhyay (Índia, 2005) Devaki, uma jovem da zona rural da Índia, é obrigada a se casar com um homem de 70 anos de idade. Na noite de núpcias, ela é brutalmente violentada pelo irmão de seu impotente marido, para marcar o domínio físico masculino sobre as mulheres.

DURO DE ENGOLIR -John Baungartner (EUA, 2005) Um depressivo gay, que passou sua vida envolvendo-se em tumultuados casos amorosos, torna-se voluntário num controvertido estudo científico. A intenção é investigar a validade de uma droga que, supostamente, transformaria gays em heterossexuais.

CAFÉ DA MANHÃ EM PLUTÃO - Neil Jordan (Inglaterra e Irlanda, 2005) Patrick "Kitten" Braden nasce numa pequena cidade da Irlanda, filho do relacionamento proibido entre o padre local e sua empregada doméstica. É abandonado ainda recém-nascido pela mãe e adotado por uma alcoólatra chamada Whiskers, que o expulsa de casa ao saber de sua homossexualidade. Sem ter para onde ir, ele se muda para Londres, onde vira cantor de cabaré e se apaixona por um político. Mas sua felicidade dura pouco, já que esse político é morto num atentado do IRA. Patrick então sai em busca da mãe desaparecida, mas acaba acusado injustamente de matar um soldado em uma boate.

ADAM´S APLE - Anders Thomas Jensen (Dinamarca 2005) Adam, um neo-nazista, está prestando serviços à comunidade sob o comando do padre Ivan. Sua obrigação é assar tortas de maçã feitas com as frutas da árvore que fica em frente da igreja. Mas os pássaros e vermes estão atacando a planta. O padre acredita que é o diabo que os está testando. Adams, no entanto, crê que o ataque vem de Deus, porque para ele o mal não existe.

RUPOFOBIA - Telmo de Campos Martins (Portugal, 2005) Empregado de um café, José é obrigado pelo patrão a amarrar um cordão no seu órgão sexual para não precisar tocá-lo quando vai ao banheiro. O patrão é obcecado por lucro e pela boa aparência de seu estabelecimento. Rui é um cliente que tem obsessão por limpeza, ou seja, é rupófobo.

DEUS NO DIVÃ -Ottmar Paraschin (Brasil, 2005) Deus criou a terra e também o homem. Depois o homem desrespeitou a Terra com sua rebeldia. Um filme falado em guarani que faz pensar e refletir sobre o futuro da humanidade.

CAMINHÃO CINZA PINTADO DE VERMELHO - Srdjan Koljevic (Sérvia e Montenegro, Eslovênia e Alemanha, 2004) Junho de 1991, últimos dias de paz na Iugoslávia. Suzana, uma jovem da capital, descobre que está grávida e decide fazer um aborto. Ela pega uma carona com Ratko, um típico bósnio totalmente daltônico que comprou um caminhão para uma viagem de lazer.

ZEROFILIA - Martin Curland (EUA, 2005) Luke é um jovem que descobre sofrer de um raro distúrbio genético chamado zerofilia. Essa inusitada condição permite-lhe trocar de sexo a seu bel-prazer, o que lhe dá muita liberdade mas também tem suas desvantagens. Como quando Luke, que se sente atraído por Michelle, se transforma em Luca, uma garota que passa a desejar o irmão da moça, Max. Em sua extraordinária jornada pelo mundo da zerofilia, Luke conhece um estilo de vida em que todas as regras sobre identidade sexual caem por terra.

TINTA FRESCA - Paula Alzugaray, Ricardo Van Steen (Brasil, 2005) Um olhar sobre as relações e as variações entre as camadas de tinta que cobrem paredes, fachadas e espaços públicos. O figurativo e o abstrato cruzam-se em linhas telefônicas, festas e mesas de bar.

segunda-feira, 17 de outubro de 2005

VENCE NA VIDA QUE DIZ SIM

- Mas ele vai adorar o novo Tang sabor laranja...

Para tudo na vida há uma primeira vez, reza o lugar-comum. E mais significativo que perder a virgindade certamente foi o dia em que o editor deste hebdomadário virtual experimentou o seu primeiro Halls Preto.

Tinha 14 anos e uma parca penugem na cara que anos depois se transformaria em barba. Mas naquela época era só uma penugem mesmo. O rapazote em questão freqüentava a escola no período vespertino, o que significa que ele dormia em todas as aulas exceto nas de História. Motivo: a lasciva Professora Vera era capaz de transformar uma explicação sobre a morte do Bispo Sardinha em um fenômeno absolutamente sensual. O umbigo dela falava por si.

Mas não era disso que eu queria falar. Um belo dia o rapazote em questão chega na escola e encontra seu amigo Marcel encostado na parede, com um pacotinho preto nos dedos. Não sei se era lançamento do produto, ou se simplesmente ninguém com 14 anos comprava Halls Preto - crianças preferem balas Kids -, mas o fato é que era uma novidade naquele grupo de caras espinhudas. Como ninguém bebia, o Halls Preto era praticamente alucinógeno. Era a coisa mais forte que alguém de 14 anos poderia colocar na boca depois de bife de fígado com gengibre.
- Quer um Halls Preto? É gostoso. Levinho...

O rapaz em questão lembra-se de ter colocado a mercadoria na boca e de quase entrar em combustão espontânea logo a seguir. Seguindo os conselhos do amigo, bebeu água com a finalidade de "acabar com o mal estar" provocado pela bala. O idiota bebeu.

Dez minutos depois, recuperado da convulsão ocasionada pela mistura água/Halls Preto, o rapazote em questão acordou namorando a idéia de sacanear as pessoas utilizando-se de um pacotinho de Halls Preto. Imediatamente seguiu até a padoca e comprou um. Finalidade: encostar na porta de sua classe e oferecer a mercadoria para todo mundo, feito traficante de jardim de infância.

A primeira vítima chamava-se Midori, uma japonesa de aproximadamente 1,23 de altura e uns 12 quilos.

- Oi, Midori. Quer um Halls Preto? Gostoso. Levinho...

A moça mordeu a isca feito um bode comendo orquídeas premiadas. Mas o rapazote em questão era um cavalheiro. Ao ver a moça estrebuchar, like a bridge over troubled water, I´d lay her down:

- Bebe água que passa! Rápido!

Foram tantas as vítimas quanto perdurou o pacotinho do Halls Preto. Não tenho certeza, mas talvez tenha sido a primeira vez que me chamaram de filhodaputa nesta vida.

quinta-feira, 13 de outubro de 2005

O MUNDO CÃO DE LUÍSA MEL

Ah, essas gengivas...

A minha vida seria menos enigmática se não houvesse uma exclamação ao final da palavra RedeTV!. Percebe? Não é RedeTV. É RedeTV! Coitado de mim que não tenho uma exclamação ao final de meu nome. E digo mais: ai dessa humanidade que se cobre de lamúrias e não de epifanias exclamativas.

Pois bem, sou um homem que vive em busca de constantes exclamações. Para isso, nutro o saudável hábito de assistir TV aos sábados, mais ou menos entre seis e sete da noite. Este horário é diariamente usufruído pelos programas do mundo cão, mas aos sábados, na RedeTV!, assim, com exclamação e tudo, existe um outro tipo de mundo cão: o Late Show, voltado ao mundo animal. Pegou o trocadalho? Late Show. Au. Fracasso de público, claro, pois o único programa que cachorro assiste é o tradicional forno de galetinhos em padoca de português.

A apresentadora é ex-namorada do dono da emissora e, portanto, do cara que botou a partícula exclamativa no nome da empresa. Mas não é disso que eu queria falar. Meu intuito é eternizar, neste hebdomadário virtual, um flagrante, um furo de reportagem que Luísa Mel conseguiu em Late Show. Guiada por uma denúncia anônima, tal qual uma Tim Lopes, a apresentadora subiu um bairro desses afastados de São Paulo - digamos, uma Vila Ré - atrás de uma mulher que guardava meia dúzia de cachorrinhos dentro de uma caixa de papelão, no armário. Luísa Mel e sua coragem de Indiana Jones apontaram a câmera e o dedão na cara da infeliz. O que se sucedeu foi uma verdadeira lição de catequese canina:

- Como a senhora tem coragem de fazer isso?!?!? Não vê que eles são.... são... são seres vivos também!!! (Nota do Editor: queria ela dizer "são seres humanos também"? Note que as exclamações voltaram)

Mas o imbroglio não acabou com o flagrante. Depois do episódio, Luísa Mel voltou com um editorial no último bloco. Sim, um editorial, onde ela aos prantos exclamava dignidade para com os cachorros.

"Vão-se os dedos, ficam as frieiras", já diria o poeta. Digo que aprendi a lição. Desde então abdiquei de todas as certezas de minha vida em nome de uma única e derradeira certeza, que me acompanhará até o ataúde: não terei cachorros. Não legarei a nenhum indivíduo o legado da RedeTV.

terça-feira, 11 de outubro de 2005

ENTRE A RAZÃO E A CIRCUNCISÃO

Peraí... se nós três estar aqui.... quem estar tomando conta do lojinha?"

Hoje é a noite do Roxaxaná. Se você não mora num kibutz ou no Higienópolis, é grande a chance de você não saber o que isso quer dizer, muito menos se levar em conta o jeito que escrevi a palavra (o correto é Rosh Hashaná, mas não fica mais elegante do jeito que coloquei?). Pois bem, doce ignóbil, Roxaxaná é a celebração judaica do nascimento de mais um ano de muito sofrimento e de muita circuncisão para o povo hebreu. Em outras palavras, é o ano novo dos cara. 5766, para ser mais preciso.

Isso pode não parecer muita coisa para você nem para mim, que sou uma autêntico White, Anglo-Saxon and Christian (meu nome verdadeiro é Ferdnand Viveston). Mas algo muito curioso ocorreu na noite deste Roxaxaná: alguns Moshas de toga e rabinho foram ao programa do Gilberto Barros ensinar as boas maneiras à mesa judaica, o que é um assunto pra lá de sugestivo pra esse blog. Gilberto Barros e seu bigodão sentado numa mesa ao lado de um sósia do Henry Sobel foi algo para se contar aos filhos - menos se eles forem judeus, é claro. Tinha umas minas meio peladas dançando do lado também.

Mas não parou por aí: a seguir, um dos Moshas disse ser adepto de um tipo de numerologia bíblica baseada nos dois últimos números do atual ano judaico. Com isso, disse o descendente de Moisés, ele era capaz de achar na Bíblia todos os acontecimentos catastróficos que têm ocorrido nos últimos tempos. Basta vasculhar uma página e, neste ano de 5766, apontar a letra que desponta a cada 66 letras do trecho. Cada letra representa um pensamento ou acontecimento passado dos judeus - ou seja, historinhas de sofrimento e circuncisão - e, juntas, as letrinhas denunciam algo horrendo que está acontecendo atualmente. Por exemplo: sabe o terremoto do Paquistão? O Mãe Dinah do Muro das Lamentações disse que conseguiu enxergar. Sabe o Catarina, aquele tornado que destelhou duas malocas em Criciúma no início do ano? Ele disse que conseguiu achar na Bíblia. Lembra daquela broxada que você deu com a sua namorada no início dos anos 90? Então, tá tudinho lá, dê uma folheada no Pentateuco.

E ainda perguntam porque eu bebo. Feliz Roxaxaná pra você também.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005

O MERCADO ESTÁ NERVOSO


Simpatizo com o senador Antônio Carlos Magalhães. Trata-se de um Jesus Cristo regado a azeite de dendê, o que gera uma panacéia intestino-mental cada vez que ele dá de abrir a boca (a referência ao JC aqui é pela fama transcendental que Toninho Malvadeza tem em sua terra natal). Em outras palavras, ACM abre os lábios e expele uma quantidade insofismável de asneiras, o que já faz parte de nossa cultura. Senador/deputado/governador/prefeito bom é aquele que "estupra mas não mata", que tem "o saco roxo", que acha que "cachorro também é gente", que é devoto de São Francisco porque "é dando que se recebe". Enfim, o sujeito só dá certo em Brasília se conseguir também legar umas boas frases de impacto à posteridade.

Em verdade, ACM não cunhou frase alguma que eu me lembre, mas deu de reverberar um clichê dos mais divertidos desde que Adão chegou para Eva e perguntou "Você vem sempre aqui?": "o mercado está nervoso". Não chamamos os assessores de Palocci de Ribeirão Preto para depor porque "o mercado ficará nervoso", eis exatamente o que disse o simpatícissimo supra-citado.
Tratra-se da desculpa perfeita: "o mercado está nervoso". Perceba, serve para absolutamente tudo: "Não convém apurar a corrupção criando CPI´s porque o mercado ficará nervoso", já vi Luís Nassif dizer. Corazza, por que você não põe logo uma peruca? "Não, o mercado ficará nervoso". Daniel Patife, que tal tratar dessa sífilis de uma vez por todas? "Não sei, e se o mercado ficar nervoso?".

O mercado é uma entidade bem bichinha.

sexta-feira, 7 de outubro de 2005

A IMPORTÂNCIA DE SER SIMPLISTA


Ao ministrar impactante palestra para jornalistas dissidentes da Cásper Líbero que migraram para a FIBO - Faculdades Integradas Ibotirama, na Augusta com a Fernando Albuquerque - disse o editor de SorryPeriferia que Oscar Wilde era uma bichinha.
O epíteto cunhado ao escritor inglês levou à loucura a bancada de Jornalismo Pansexual da casa, liderados pelo Professor Zigbniew Corizza, que organizou um motim como forma de protesto. Cadeiras voaram, bifes de fígado levemente faisandés foram arremessados e três prostitutas que procuravam clientes no balcão suicidaram-se pela comoção de momento.

Em verdade não há nada de errado em ser bichinha, o que também não influi no fato do grande figura humana e literária ser bom ou não. Da mesma forma, Adílson Maguila era um machão inveterado, porém péssimo boxeur.

Porque no fundo é tudo a mesma coisa. Fica aí a simplificação.

quinta-feira, 29 de setembro de 2005

ESBOÇO DE ROTEIRO PARA CURTA-METRAGEM DE QUALIDADE DUVIDOSA

Tomada 1: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. Uma delas muge.

Tomada 2: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. A outra delas muge.

Tomada 3: Vácuo de som, vácuo de ar. Uma luz resplancedente toma de assalto o recinto.

Tomada 4: FERNANDO VIVES!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Tomada 5: Luz some, ambiente volta ao normal.

Tomada 6: Duas vaquinhas param de pastar e entreolham-se. Vaquinha 1 levanta as sobrancelhas.

Tomada 7: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. Ambas se recusam a mugir.

Tomada 8: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. Silêncio.

Tomada 9: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica.

FIM DO ROLO

quarta-feira, 28 de setembro de 2005

O JORNAL E SUAS METAMORFOSES

Um senhor pega um bonde depois de comprar o jornal e pô-lo debaixo do braço.

Meia hora depois, desce com o mesmo jornal debaixo do mesmo braço. Mas já não é o mesmo jornal, agora é um monte de folhas impressas que o senhor abandona num banco de praça.

Mal fica sozinho na praça, o monte de folhas impressas se transforma outra vez em jornal, até que um rapaz o descobre, o lê, e o deixa transformado num monte de folhas impressas.

Mal fica sozinho no banco, o monte de folhas impressas se transforma outra vez em jornal, até que uma velha o encontra, o lê e o deixa transformado num monte de folhas impressas. Depois, leva-o para casa e no caminho e aproveita-o para embrulhar um molho de acelga, que é para o que servem os jornais depois dessas excitantes metamorfoses.

*de Histórias de Cronópios e de Famas, Julio Cortazar.

VERÁS QUE UM FILHO TEU NÃO FOGE ÀS PINGAS

Voltei

Foi ao observar vaquinhas coloridas pela Paulista que mais uma vez encontrei uma criança debaixo de meu pé direito e resolvi voltar a blogar. A vítima da vez era de ascendência japonesa e não tinha mais que sete primaveras, tendo desgarrado-se dos braços orientais da mãe apenas três passos antes de virar piche sob minha sola 47. Enquanto a progenitora esgoelava, concluí abstraidamente que o infanticídio involuntário já é tradição nestes 24 verões de existência, tanto quanto escrever neste hebdomadário virtual. Logo, entre acabá-lo de vez e voltar a enchê-lo de palavras nauseantes contra o PSDB, a Cásper Líbero ou a mãe do Corizza, optei por esta última.

Mas a dúvida que me pegou entre o fígado e a alma é: o que escrever? O fígado me deu a resposta antes da alma. Sábado passado, ao acordar de sonhos intranqüilos, o editor de SorryPeriferia pegou-se em apartamento estranho debruçado sobre um vaso sanitário de cor roxa (ou seria vinho?). Ele sabia que não devia misturar cerveja excessiva, uma garrafa de Almadén e caldinho de sururú, além do famoso cigarro que passarinho não fuma, mas resolveu pagar para ver. O resultado da nauseabunda miscigenação alcoólica foi parar no supra-citado vaso cor vinho (ou seria verde-musgo?) ao som de Paulinho da Viola que vinha da sala. A cada frase de Foi um rio que passou em minha vida, um pouco de minha dignidade se deixou levar tubulação adentro.

Agora, devidamente recuperado de tamanha falácia etílica, incubo-me da tarefa de soerguer a moral utilizando-me deste blog.

Vão-se os porres, mas o fígado fica.

Voltei.


(em breve: novo lay-out)

sexta-feira, 9 de setembro de 2005

FALANDO MACIO E CARREGANDO UM GRANDE PORRETE

Particularmente não simpatizo com cinderelas. Todas as cinderelas que conheci em vida se transformaram em abóbora à meia-noite. Prefiro muito mais uma mulher que aperte minhas bochechas e diga "Gosto de ti, mas saiba que também prefiro as putas". Nunca de alguma maluca que se aconchegue em platonices canastronas.

Penso também que príncipes encantados acabaram junto com a monarquia. Se você não conseguiu achar meia dúzia de homens da sua vida andando uma hora por dia pela Praça da Sé, o problema é com você, não com a humanidade. A recíproca também é verdadeira: mais chato que uma cinderela só mesmo um cinderelo. Casimiro de Abreu foi um sujeito muito chato.

No fundo a cinderelice é o anti-romantismo. Não enxerga quem não quer. Como o Antônio Abujamra sempre repete: a vida não dá presente a ninguém. Se você quer uma vida, aprenda a roubá-la.

quarta-feira, 31 de agosto de 2005

PAUSA SOBRE A PAUSA

Se você não tem nada para fazer enquanto curte o recesso de SorryPeriferia, sugiro que leia o blog do Marcos Valério.

Detalhe para o post "Tara pelo sangue derramado", que contém um comentário assinado por um tal de Vives, que deixou a seguinte frase: "Põe uma foto de quando você era cabeludo aí, ô". Ao que parece, esse sujeito que anticonstitucionalissimamente assina como Vives também deixou um spam com a frase "ENLARGE YOUR PENIS".

Procurado pela reportagem de SorryPeriferia, Marcos Valério não quis comentar o assunto.

Segue a pausa.

sexta-feira, 5 de agosto de 2005

CARTA ABERTA AOS LEITORES DE SORRY PERIFERIA


Caros,

reza a lenda que momentos antes de morrer, Ludwig Van Beethoven olhou pela última vez para as partituras que forravam seu piano e encheu de lágrimas os próprios olhos. Beethoven pressentia ser aquela a última visão daquilo que mais representava sua vida, e tinha consciência do quão grandiosa ela havia sido. Momentos depois Ludwig deitou tristonho em seu leito e pereceu, com a brisa da manhã a entrar pela janela, ao som do canto triste das cotovias.

Em verdade essa lenda é uma mentira estapafúrdia inventada por mim agora mesmo com o único objetivo de parecer mais culto. Se não me engano, o dito cujo aí em cima morreu doidivanas, com um sério problema de incontinência urinária e intestinal, e me corrijam os que realmente sabem da história. Mas, convenhamos, o meu fim tem mais glamour.

Pois bem. Todo mundo tem um pouco de Beethoven. No meu caso, compartilho com o mestre um pouco da surdez e olhe lá - ah, esses malditos rolhões de cêra de ouvido. Taí uma hipótese: se já existisse naquela época essas pistolinhas d´água que os médicos usam pra limpar nossos ouvidos, talvez a história de Beethoven tivesse sido mais feliz.

Posto o intróito sem sentido, digo que convém uma pausa. Ah se convém uma pausa. Neste blog. Duas semanas, quatro talvez. Ele está cansado. Foi-se a espontaneidade, a risada boba das linhas imprevistas. Há hoje aqui uma fuga do que sempre quis fazer, que pode ser retratado por uma sucessão de posts com textos quadrados, compridos e prolixos.

Tentemos mais tarde, portanto. Voltarei, não há dúvidas, porque escrever é minha terapia automática e intransponível. É o que eu faço quando estou nervoso. É o que eu faço quando estou triste. É o que eu faço quando estou feliz. Aproveitemos o momento de anomia e reflexão pelo qual passa o editor do blog, que sente suas energias esgotadas. Utilizando um linguajar freicanéico: bad vibe.

O editor de SorryPeriferia sempre foi um autista por opção, mas sente que atingiu um extremo nas últimas cinco ou seis semanas. Uma estafa passageira e sem sentido, causada pelo absolutamente nada somado ao excesso diário de internet. Nóia. Como diria o filósofo Wander Wildner, "não consigo ser alegre o tempo inteiro". Logo, ele se recolhe ao seu porto metafísico - o copyright desta expressão não é meu - para voltar muito em breve tinindo as energias, como em tempos recentes. Assim voltará a escrever, porque mais do que nunca ele precisa disso para pagar suas contas. E então voltará, de preferência se referindo a si mesmo na primeira pessoa, porque ele abomina quem escreve sobre si na terceira, como agora está fazendo só por pirraça.

Enfim, deselegante.

Portanto, masoquista leitor, este blog volta em algumas semanas. Com um visual novo, talvez, e com idéias novas, reinventado. Para quem gosta dele, convém aguardar. Para quem não gosta, resta o consolo de poder admirar a foto acima, da insofismável Catherine Zeta-Johnes, eterno colírio que carregarei para o além-vida. Errei: além da parcial surdez, tenho de Beethoven também a minha amada imortal. Ela fica aí em cima enquanto não retorno a escrever, espantando as más energias.

A gente se vê por aí,

Lives.

segunda-feira, 1 de agosto de 2005

THIS IS THE END, BEAUTIFUL FRIEND

De Niro, Taxi Driver, 1976.

"É preferível ser rei por uma noite do que um tolo a vida inteira". Rupert Pupkin, personagem de Robert De Niro em O Rei da Comédia (Martin Scorsese, 1983).


Houve um tempo em que Hollywood fazia filmes para as pessoas pensarem nelas mesmas dentro de um contexto social, e dizendo isso pareço um velho marxista derrotado pela queda do Muro de Berlim. Mas dane-se. O Rei da Comédia, de Scorsese, é a tampa do caixão deste período, que ao meu entender surgiu forte nos anos 60, teve seu clímax durante os 70 e foi enterrado no início dos 80. Falo (ui) de um tempo em que as grandes caixas redondas recheadas de película que saíam da Califórnia - e que chegavam até àquele cinema do seu bairro que já não existe mais - tinham também o objetivo de discutir o que eram os States, apontar suas fraquezas e, em muitos casos, colidir de frente com todos os governantes estúpidos das escalas municipal, estadual e federal. Da polícia de Nova Iorque ao FBI. Os donos do poder, enfim, com as calças na mão. Falo (dane-se o cacófato) de filmes como Dr. Fantástico e Nascido para Matar, de Kubrick, Apocalypse Now e A Conversação (Coppola), Táxi Driver e O Rei da Comédia (Scorsese), M.A.S.H. (Robert Altman), Todos os Homens do Presidente (Alan Pakula), Serpico e Um dia de Cão (Sidney Lumet), Muito Além do Jardim (Hal Ashby), entre tantos outros que não assisti, não lembro ou que desconheço a existência. (só achei os nomes de Pakula e Ashby no Google, não conhecia nenhuma dos dois).

Aluguei há alguns dias O Rei de Comédia, que há muito queria ver e não achava em locadora alguma. Não ri. Não que seja mal feito, muito pelo contrário, mas o contexto em que a dita comédia se insere é angustiante. O drama de carência moral e afetiva por que passam os personagens de De Niro e de sua amiga (cujo nome não sei) é trágico. No fim, com um nó de angústia entalado na garganta, você passa dias pensando se não corre o risco de ficar como aqueles personagens, e faz algumas observações sobre a frieza com a qual os americanos tratam uns aos outros. Enfim, o cinema que te pede para pensar. Brilhante.

Scorsese, o diretor, assume nos extras que produções assim não podem ser realizadas atualmente. O contexto do cinema, segundo ele, mudou. O Rei da Comédia teria sido o último dos filmes que discutiam as carências da sociedade norte-americana do ponto de vista do homem, do ponto de vista da sociedade e, em muitos casos, do ponto de vista dos donos do poder.
De fato, não se vê mais filmes com esta toada, salvo um O Informante aqui, outro Um dia de Fúria ali. Mas nunca mais uma tendência questionadora. Depois que certos dois predinhos desabaram em Nova Iorque então, não fazer filmes que incomodem coisas da política ou da sociedade de nosso Grande Irmão do Norte passou a ser um ato de patriotismo.

Mas por quê, afinal?

Dizem que Ronald Reagan - um ex-ator, lembre-se - não queria seguir os caminhos de Nixon no que se refere a deixar-se parecer o que realmente ele era, ou seja, um tapado utópico, tal qual Nixon. Assim Reagan teria começado a seduzir os chefões de Hollywood, prática intensificada por Bush Pai, Clinton e, sobretudo agora, por Baby Bush. Agora, os donos do poder e os donos do cinema mantém relações carnais que causariam inveja a Carlos Menen, que tanto quis uma algo mais entre a Argentina e os States.

A conseqüência é esse cinemão burrocêntrico que hoje vemos por aí. Um gênio como o Scorsese fazendo algo como O Aviador, uma superprodução burocrática que não quer dizer nada a ninguém. Robert De Niro, talvez o grande ator desta toada pensante dos anos 70, hoje vive de comédia para a família republicana média assistir com o cachorro na sala.

A questão de O Rei da Comédia é a própria questão de Hollywood. Tal qual a frase de Rupert Pupkin, o personagem de De Niro, o cinema de Hollywood foi rei por uma noite, mas tolo por todo o resto de sua existência. A lamentar.

OBS: Pessoalmente acho que temos bons filmes atualmente, mas longe deste contexto político. E duvido que teremos.

sexta-feira, 29 de julho de 2005

NOTA AUTOBIOGRÁFICA DESPROVIDA DE SENTIDO

O editor de SorryPeriferia (rodeado pela argolinha) posa para fotos com colegas no Hospital de Tratamento Psiquiátrico Intensivo em 23 de abril de 1970, seis meses antes de abandoná-lo

Perguntam-me sobre minha história. Lhes contarei. Sou o fruto de uma pisadela e de um beliscão entre meus pais, uma aventura banal, fim de rastapé de interior. Nove meses se passaram e eu nasci. Tudo que sei é que desde então fiquei internado em um sanatório, donde sairia 20 anos depois. Pelo que pude apurar, não tive alta: me dispensaram porque comi a maçaneta da porta do almoxarifado. Estava com fome e não agüentava mais a péssima qualidade da comida que me davam. Eles passavam o prato de sopa cor-de-burro-quando-foge por baixo da porta do porão - onde eu dormia - ao acordar e antes de dormir. Eram as duas refeições do meu dia. Pouco comia, pois os ratos eram sempre maioria e costumavam ser mais rápidos do que eu.

Sem rumo, procurei minha mãe. Quando me viu ela disse: "Não conheço nenhum Vives. Suma daqui". Após insistência, ela vagamente se lembrou de um dia ter tido um filho. Moraria com ela por uns tempos até conseguir me arranjar na vida, o que nunca aconteceu. Todas as noites ela colocava um saco sobre minha cabeça antes de dar o beijo de boa noite. Felizmente, logo conheci minha primeira namorada, por quem perdidamente me apaixonei.

Chamava-se Rulfia, e era estivadora do porto de Mixirica da Serra - mixirica com i mesmo -, onde carregava de bigornas um navio ferreiro. Era a única estivadora mulher do porto de Mixirica da Serra. Em verdade, era a única a fazer esta função naquele local, que carregava de bigornas sempre o mesmo navio, o único a atracar no porto da cidade e que de lá nunca desatracou. Passamos a morar juntos, num chatô de sapé que ela mantinha perto do cais.
Foi com Rulfia a minha primeira noite de amor. Mas registre-se, também, que com Rulfia nunca atingí o clímax. Ela chegava cansada do porto, não gostava de fazer as preliminares e quase sempre dormia em cima de mim. Rulfia tinha crises agudas de TPM. Em uma delas, trouxe uma bigorna do porto só porque cobrei-lhe que não dormisse sobre mim durante o ato. Arremessou-me o objeto no joelho, o que me deixou levemente coxo até os dias de hoje. Mas eu amava Rulfia mesmo assim.

Porém, certo dia ela entrou no navio ferreiro com uma bigorna nos ombros e de lá nunca mais saiu. Vasculharam a embarcação toda e nada acharam. Nem sequer uma bigorna foi encontrada lá dentro, nenhuma de todas aquelas que Rulfia lá levou nos últimos dez anos, todos os dias, dez horas por dia, folgando aos domingos e dias santos. Rulfia se foi, para onde ninguém sabia, deixando uma lacuna em meus sentimentos. O mistério de Rulfia e as bigornas afugentou os habitantes de Mixirica da Serra, que abandonaram a cidade. Lá restou apenas o navio ferreiro aberto e milhares de bigornas ao lado para serem carregadas.

Vim para capital. Comecei a beber e conheci os livros. Muitos deles. Em verdade nunca soube ler, mas eu via as figurinhas. Um deles mudou a minha vida. Chamava-se Kama Sutra para Crianças: Aprenda Hoje o que Você vai Querer Fazer Amanhã, e tinha figuras tão interessantes que pela primeira vez na vida ousei querer ler. Mas nunca aprendi. Continuei bebendo, porque a bebida era o que me restara de concreto, embora líquido. Fiz dois amigos, o Mato Grosso e o Joca, que andavam jogados pela Avenida São João.

No auge de minha agonia causada pelas saudades de Rulfia e por não saber ler, prestei Jornalismo em uma faculdade de nível mediano na Avenida Paulista. E, embora analfabeto, nunca desconfiaram disso e vivem me dizendo que levo jeito pra coisa (embora talvez discorde), o que me levou a arrumar emprego no jornal-laboratório local, onde plagiei uma receita de bolo de ameixa, sem ninguém nunca ter desconfiado.

Passei a viver de frilas esporádicos em revistas de primeira, segunda e terceira categorias, o que me possibilitou fazer planos pela primeira vez na vida. Eu, Mato Grosso e o Joca nos mudamos para uma casa velha, uma palacete assobrado, e lá vivemos os grandes dias de nossas vidas. Mas um dia veio os homem com as ferramenta, o dono mandou derrubar. A casa velha, o palacete assobrado estava no nome de um tal de Aureliano Buendia, austero fazendeiro de uma cidade do interior da América Latina, casado com ninguém menos que Rulfia Vives, a carregadora de bigornas, única mulher que amei na vida. Rulfia havia fugido para a terra de seu amante, onde vive a bater suas bigornas em meio a tapetes voadores e velhas mágicas.

Nota do narrador onisciente: A última notícia que tiveram de F. Vives é que ele foi visto com outra, num Fuscão preto pela cidade a rodar, e também parado em frente ao Ibotirama, onde comia um bife de fígado com a dita cuja que, suspeita-se, seja uma americana casada de nome Catherine. Pelo que pude apurar, parece que tem muito orgulho disso.

NOT TO BE CONTINUED.

segunda-feira, 25 de julho de 2005

DAS COISAS QUE A HUMANIDADE EXAGEROU

Flagrante da família Corizza durante piquenique na Era Paleozóica: Felipe é o que mostra a bunda para a câmera

Há um momento de angústia profunda e pausa na respiração quando penso no primeiro homem que olhou para um quiabo e disse "eu vou comer isso". Apesar de minha relutância gástrica, compreendo que a humanidade um dia já padeceu de fome profunda - e ainda padece - e que o bicho-homem precisava estar aberto a novas experiências, e não é de homossexualismo que estou falando. Enfim, ele tinha que colocar qualquer coisa na boca e engolir - eu já disse que não é de homossexualismo que estou falando - tal qual um Antônio Mezenga comendo bigatinhos na floresta depois que o avião caiu.

Creio que esse raciocínio justifica não só o quiabo como também o jiló, a buchada de bode, a linguada de boi e o curanchinho do frango. Na próxima vez que você olhar torto para alguém a saborear uma jaca, pense que um ancestral seu de 75 gerações atrás pode ter comido uma similar e sobrevivido às intempéries, o que manteve de pé a perpetuação desse gene arrogante dentro de você, que te faz olhar para a jaca com cara de "isso é um tanto disgusting".

Por outro lado, percebo que houve um momento na história em que sucessivos desvios de conduta fizeram do homem o único bicho capaz de compreender que dois com dois são quatro, mas também de fazer as coisas mais imbecis como se fosse o percurso natural da vida. Por exemplo: mordo-me ao pensar no primeiro sujeito que escalou cinco quilômetros de uma montanha e, ao chegar no topo, pensou "Quebrei meus poucos dedos que não gangrenaram, mas isso foi sensacional. Porque não fazer de novo e transformar isso em uma modalidade de esporte masoquista"?

Mas o alpinismo não é nada se comparado a uma manchete que certa vez li na internet: "Flórida estuda legalizar arremesso de anões". Diz-se que na terra da Disney a prática de jogar pessoinhas à distância é tão comum que há um movimento para que tal fenômeno seja reconhecido pela Estado como um esporte. Particularmente nutro o hábito de arremessar alguns amigos em festas quando me encontro trebadaço, anões ou não, mas não encaro isso como uma modalidade esportiva, para alegria da minha amiga Karen C..

Voltemos ao quesito gastronomia e similares. Enquanto tomava capirinha no Ibotirama com três figuras interessantes no último sábado, o mais exótico deles relatou o prazer que sente ao tomar uma cachaça curtida com cobra coral falsa. Explico: coloque a pinga em vasilhame junto de uma cobra coral falsa morta. Com o tempo, o bicho vai se desmanchando e a bebida adquire gosto e coloração muito específicas. Tal fenômeno ocorre com regularidade em Minas Gerais, não com manjericão, não com pimenta: com répteis mortos.

A imagem de tal vasilhame no balcão de um boteco qualquer, ao lado do compartimento de ovos coloridos, pegou-me entre o fígado e a alma. Como diria Alberto Einstein: "Só conheço duas coisas que não têm limite: o espaço sideral e a estupidez humana".

A minha parte eu quero em pinga. Sem animais mortos.

quarta-feira, 13 de julho de 2005

QUANDO A LITERATURA É MAIS COXINHA

do enviado a Parati

Se você faz uma feira de automóveis, as pessoas vão lá para discutir automóveis. Da última perua Jaguar à repimboca da parafuseta automática daquela marca coreana cujo nome você nem se lembra. Da mesma forma, ao freqüentar uma feira de coxinhas, as pessoas discutirão coxinhas. Receitas, condimentos, recheios, coxinhas lactovegetarianas, coxinha de cupuaçu com mel, Coxinheira George Foreman. Em feira de coxinha, coxinha rules. Agora siga a bolinha pulando na legenda: em feira literária, as pessoas vão lá pra discutir literatura, não é?

Claro que não, seu burro. Pelo menos não é isso o que pensam os cocotões que organizaram a III Feira Literária Internacional de Parati, a FLIP. Em verdade, o que se viu por lá foi nada além de uma overdose propagandística de lançamentos de meia dúzia de grandes editoras.
A idéia era organizar várias mesas de discussão por dia. Pois então imagine dois ou três escritores fodões sentados em uma mesma mesa, apresentados normalmente por um outro escritor fodão. Todos com livros recém-lançados, é claro. Em cada mesa, um tema a ser discutido. Até aí, a água enche a boca - e de fato não tenho nada contra o viés comercial da coisa.

Eis quando você percebe que o presunto-de-parma vira apresuntado. Após serem apresentados, o escritor A lê um trecho de seu lançamento para a platéia que pagou 17 reais para vê-los no salão principal, ou 12 para ver tudo no telão do outro lado. É aplaudido. Depois, é a vez do escritor B ler o seu lançamento. É aplaudido. Segue duas ou três perguntas. São aplaudidas. Aí os escritores vão embora aplaudidos e, no lado de fora, sentam para autografar, sob aplausos, os livros que os espectadores compraram na livraria conveniada, com os mesmos preços de São Paulo. Observando atônitos a tudo isso, nós.

Mas ninguém nos aplaudiu.

Me desculpe, mas se é pra ouvir trechos dos livros, eu entro no Submarino e leio o primeiro capítulo de cada um. Seria melhor então criarem um serviço 0900 onde uma voz feminina sensual lesse um trecho da obra escolhida.

Não se discutiu literatura. Não sei viu pessoas preocupadas em discutir tendências, um autor, uma obra que seja. Havia sim pessoas que queriam ver e ser vistas. A FLIP não passou de uma grande masturbação mental coletiva. E, apesar de ser uma feira, sequer houve local onde se pudesse comprar livros com preços mais baratos. Necas. Tudo isso em uma cidade que fede esgoto e onde o PF mais barato custa 16 reais. Um reles pastel de palmito, 5 contos. A minha paciência jogada no lixo: não tem preço.

Por outro lado, se o xis da questão era ver figurinhas tarimbadas em situações pouco usuais, isso a gente se superou. Eu mais uma figura mui falciônica seguimos Salman Rushdie pelas vielas da cidade junto de uma loira, que ele não catou, embora a dita cuja tenha feito de tudo para isso; dei duas ombradas na Zezé Polessa em ocasiões diferentes, o que provavelmente a fez pensar que "esse cara grande tá cheio de graça pro meu lado"; vários atores de teatros cujo nome a gente não lembra, mas que sempre fazem um ponta nas Xica da Silva da vida. E até uma ex-popozuda que sempre aparecia pelada na novela Pantanal, mas cujo nome só a mãe dela de fato se recorda. Ah, e é claro, Gabriel Aveia Kwak.

Enfim, a minha parte da FLIP eu quero em pinga. Aliás, em agosto tem a Feira da Cachaça de Parati.

Faz sentido. Só bebendo pra esquecer.

terça-feira, 5 de julho de 2005

BODE VADIO

A Mulher do Próxim, de Gay Talese, está em minha cabeceira há alguns dias. Um livro que fala sobre a América e sobre o sexo. 

Para você que não o leu, isso pode significar absolutamente nada. Mas agora que atravesso a metade do livro, me sinto mais libidinoso que o Itamar Franco na Sapucaí em 93. Praticamente um Jece Valadão. Todas as taras que aprendi lendo Nelson Rodrigues e revistinhas de sacanagem na adolescência agora reverberam dias inteiros na minha cabeça - e não só na minha cabeça. 

- Só conheceu a derradeira felicidade o homem que possuiu a cunhada proibida. 

- Toda tara por amor não é tara. 

- Essa menina assanhada bem vale um crime sexual. 

- Me ama, mas me bate, porque eu não te mereço. 

- Perdoa-me, meu bem, por me traíres. 

- Quem foi que desenhou esses malditos caralhinhos voadores na parede do banheiro? 


A você, mulher comprometida, recomendo distância. 

quarta-feira, 29 de junho de 2005

BREVE HISTÓRIA DO PRINCÍPIO DA HUMANIDADE

"Oi, você vem sempre aqui?"

Primeiro não havia nada. Depois, havia Deus. E Deus disse: "faça-se a luz", e a luz foi feita. E Deus disse: "faça-se o firmamento", e o firmamento foi feito. Aí Deus gostou da idéia e fez um monte de coisa, mas ficou triste porque ninguém admirava sua obra. Coisa de artista. Foi quando no quinto dia ele botou um punhadão de argila no molde e criou Adão, bem ao estilo Ghost mesmo, só que sem a Demi Moore e sem a Unchained Melody. Mas logo a coisa degringolou, porque Adão, embora gente boa, era daqueles sujeitos grudentos. Era Deus o parceiro de Adão no pôquer, era com Deus que Adão discutia o futebol do fim de semana, era com Deus que Adão falava mal do jardineiro do Éden. Tanto encheu os pacovás que pouco tempo depois o Todo-Poderoso criou uma companhia para ele, utilizando-se para isso uma costela e um teco de carne dos glúteos adãonicos. 

E foi neste momento de reluzente inspiração que Deus criou duas coisas que mudaram os rumos da humanidade: a mulher e a hérnia de disco. Uma coisa levou a outra. Adão nunca mais foi o mesmo depois da cirurgia da retirada da costela, e ganhou de brinde uma voluptuosa hérnia. Passou a andar levemente curvado, o que piorou com o tempo. Certo dia, ele sofria tanto com a dor que acabou envergado ao lado de uma árvore, no meio do Éden. Eva, que, nua, colhia figos pelos campos, saiu correndo em direção ao pobre coitado a fim de socorrê-lo. 

Adão ouviu os passos, olhou para o horizonte e pôde enfim sentir o insofismável prazer de ser homem. Suas partes íntimas deram sinal de vida enquanto ele observava aquela escultura a correr exibindo lascivamente suas curvas sinuosas, seus seios aconchegantes e firmes pululando comoventemente envoltos pelo cabelos longos soltos sobre os ombros. O sorriso bobo e provocante. E tinham as coxas, ah as coxas. Dois generosos ramos de carnes esculturalmente delineados que se revezavam com pressa até chegar ao local onde Adão padecia. E quando isso ocorreu, Eva o abraçou, e o ergueu, e o abraçou de novo. 

Adão mordeus os lábios: 

- Até que, pra quem era uma costela há uma semana, você tá bem jeitosinha. 

Apesar do linguajar cafajeste, nove meses depois, nasciam os gêmeos Caim e Abel. Mas não nasceram no Éden, pois este ficava na região central da cidade, onde o preço do condomínio aumentou barbaridade. Desempregado, Adão foi expulso por falta de pagamento e mudou-se com a trupe para a Vila Ré, onde tratou de cuidar dos filhos. 

Em verdade, Caim e Abel se odiavam. O primeiro era Curíntia roxo. O segundo, Verdão. Um queria ser o Magaren, o outro se vestia de Jaspion. Enquanto Caim filiava-se ao PSDB, Abel comprava a boina do Hugo Chavez. Cresceram alimentando esse antagonismo. E, na idade do vestibular, Caim prestou Publicidade. Abel, jornalismo. Ambos passaram em uma faculdade de nível mediano na Avenida Paulista. 

Meses depois, durante a semana de provas, Caim matou Abel ao arremessar-lhe o História da Imprensa no Brasil na cabeça. Nascia ali o neoliberalismo, o PFL, a propaganda das Casas Bahia e a esquistossomose. 

Mas essa já é uma outra História.

quarta-feira, 22 de junho de 2005

POR ISSO CUIDADO, MEU BEM, HÁ PERIGO NA ESQUINA...


- Você sabe que terá um dia feliz quando, ao acordar, sai de roupão no quintal para checar a caixa do correio, e dá de cara com sua nova vizinha, uma morena lasciva à la Catherine Zeta-Johnes, subindo a rua com uma minissaia de provocar rachaduras nas paredes do Vaticano. Com esse frio.


- O Jornal da Gazeta desta noite - sim, o Jornal da Gazeta - dedicou uma reportagem (bem feita) de cinco minutos sobre a vida do filósofo Jean-Paul Sartre, que completaria 100 anos neste 21 de junho. Jornal do inferno são os outros.

- Somente agora, aos 24 anos de idade, compreendi de maneira ampla e límpida o significado da palavra escatologia. Foi neste fim de semana, quando ouvi pela primeira vez o dueto entre Renato Russo e Gabriel o Pensador.


- Um derrame cerebral deixou o simpatissímo General Augusto Pinochet, um dos meus ídolos, a babar freneticamente pelo breve resto de sua existência. Me incomoda que meia dúzia de rancorosos ainda o acusem de ter mandado matar 3 mil pessoas há uns anos atrás. Parentes próximos dele declararam que não agüentam mais vê-lo sofrer o que vem sofrendo nos últimos dez anos. SorryPeriferia homenageia seu guru, o Velho Pinocha, com Lennon e McCartney: And in the end, the love you take is equal to the love you make.


- Fiquei olhando Faiéco subindo na camioneta e desaparecer na esquina. A noite estava limpa, vi que não ia dormir fácil com aquela história atravessada na alma e subi com ela lá pra cima do meu zigurate. Ali fiquei um bom tempo pensando nos caminhos e descaminhos dessa vida. Olha eu, Senhor, olha eu. Tanto sonho e aonde vim parar? Em cima de uma caixa d´água, perdido entre as estrelas, acuado entre a dor das coisas que não são mais e o medo daquelas que não são ainda. Nessa aflição que não sabe se é de aurora ou crepúsculo. Tanta luz naquele céu e eu não conseguia decifrar se na minha vida estava clareando um pouco ou escurecendo de vez.

Trecho de Agora Deus vai te pegar lá fora, do jornalista Carlos Moraes, livro que li há algumas semanas e que coçou devagarinho aquele vão entre o fígado e a alma que existe dentro de cada um. Chupa, Pinochet.

segunda-feira, 20 de junho de 2005

RELATO DRAMÁTICO DE UMA SUBVERSÃO DE PARADIGMA EM EXPERIÊNCIA ANTROPOLÓGICA FRACASSADA

Lá se vão alguns milhões de anos de quando aquele macaco jogou o osso pra cima e a música do 2001: Uma Odisséia no Espaço começou a ecoar pelos quatro cantos do planeta. Deduzo que Stanley Kubrick quis dizer que a música do Richard Strauss foi o primeiro hit que tocou por aí. Mas até esse domingo à noite, pelo menos, nenhuma ranhura rupestre fazendo menção a um top 100 da Era Paleozóica foi descoberta. Digo que, fosse eu um homem de Cro-Magnon nos dias atuais, deixaria para a posteridade nas paredes das cavernas a experiência que é assistir a um show qualquer de rock em uma reles cidade do interior. Sobretudo de bandinha cover. Sobretudo em Jundiaí.

Um fim de semana desses fui assistir ao show de um cover do Jimmi Hendrix, o que considerei uma experiência antropológica de vasto teor arquetipico. Junto dos nativos habituês do recinto, eu, esse candidato a Hans Staden musical.

Espalhados pelos cantos do ambiente, sobretudo as pilastradas, alguns trintões e quarentões vestidos de preto franziam a testa, com claro objetivo de parecerem maus. Na minha humilde visão antropológica, deduzi que fazem parte de uma espécie de roqueiro frustrado. "Eu não fui o roqueiro que achava que seria quando me olhava no espelho aos 15 anos. Logo, franzo a testa pra ficar com cara de mau". Ainda não compreendo essa relação, assim como não entendi essa fixação pelas pilastras do recinto.

Em grupos, de frente pra banda que ia tocar, os cabeludos e espinhentos de 15 a 18 anos. Melenas flertando com os quadris e aquela barba adolescente que ainda não é barba, e sim penugem. Camisas pretas fazendo referência a Ramones, Stratovarius Vision, Type O Negative e, é claro, Metallica. Mais clichê que isso, só avó dizendo pra não esquecer o guarda-chuva ao sair de casa.

E tem os fãs do Raul Seixas. Porque existe no mundo mais fã do Raul Seixas do que a aids e o refrigerente juntos, só pra usar uma expressão falconiana. Mas disso eu falo mais para baixo.

Quando todos estão devidamente entupidos de maconha barata e cerveja Cintra morna, eis que surge o tal cover do Jimmi Hendrix, que nada mais era um sósia do Vampeta, ex-jogador do Curíntia, com uma bandana na cabeça. Quando ele subiu no palco, o antropólogo aqui cometeu um erro grave, pelo qual a academia jamais me perdoaria: influenciei os nativos objetos de meu estudo. Em outras palavras, apontei o dedão pro ilustre e gritei:

- HEY, O JIMMI HENDRIX É O VAMPETA!

Umas dez ou quinze pessoas que estavam ao meu lado acharam simpático esse epíteto, e passaram a usá-lo com freqüência durante o show. E quando o nosso amigo terminou a interpretação vampêtica de Are You Experienced?, um coro se destacou:

- U, JIMMI PETA!! U, JIMMI PETA!! U, JIMMI PETA!!

No final, Jimmi Peta foi ovacionado pelo público, talvez como nunca fora em sua curta carreira de cover do roqueiro e sósia do Vampeta. Saiu aplaudido, porém, desconfio, desmoralizado. Apenas os quarentões com cara de mau continuavam encostados nas pilastas, catatônicos.

***

Pois bem, minha experiência antropológica pelo submundo dos shows de rock em Jundiaí não parou por aí. Quinze dias depois - esta última sexta - fui a um show de blues no mesmo local. Cheguei na metade e gostei do que vi, com exceção da estranha grande quantidade de pessoas com camisas do Raul Seixas. Até os quarentões encontados nas pilastras estavam com camisas do Raulzito, o que lhes conferiu um semblante ainda mais tristonho.

A resposta para tal fenômeno: após a banda de blues, uma banda cover de Raul Seixas, o que me fez sentir uma pontada entre o fígado e a alma. Não tenho nada contra Raul, mas certamente fãs de Raul sucks. E agora, eles iriam gritar "Toca Raul?" pra quem, uam vez que o show era sobre o próprio?

Foi então que eu, anti-antropologicamente, resolvi me vingar.

O guitarrista da banda, péssima por sinal, era exatamente o Kenny G. Não era parecido, nem tinha o ar similar: era o Kenny G. Ouso dizer até que era mais parecido que o Kenny G do que o próprio Kenny G. Foi então que, durante Ouro de Tolo, comecei a gritar:

- TOCA KENNY G!!!! TOCA KENNY G!!!

Poucos risos, muitas caretas para mim. Entre essas, alguns rangidos de dentes e até um "Filhodaputa" foi ouvido. Foi então que meus amigos elegantemente me convidaram para tomar uma Cintra morna lá fora, uma vez que "você é grande mas não é 75".

Mas eu já tinha me vingado. Gritam "Toca Raul!!!" até em velório; subverti o paradigma gritando "Toca Kenny G!" em um show cover do Raul de quinta categoria. Valorizei meu passe, embora minha antropologia tenha uma concepção muito particular.

Os únicos lá dentro que não deram bola para o "Toca Kenny G!" foram os quarentões melancólicos com suas camisas do Raul. Eles permaneceram lá, vis, impassíveis em suas pilastras. Como as pedras que choram sozinhas no mesmo lugar.