segunda-feira, 1 de agosto de 2005

THIS IS THE END, BEAUTIFUL FRIEND

De Niro, Taxi Driver, 1976.

"É preferível ser rei por uma noite do que um tolo a vida inteira". Rupert Pupkin, personagem de Robert De Niro em O Rei da Comédia (Martin Scorsese, 1983).


Houve um tempo em que Hollywood fazia filmes para as pessoas pensarem nelas mesmas dentro de um contexto social, e dizendo isso pareço um velho marxista derrotado pela queda do Muro de Berlim. Mas dane-se. O Rei da Comédia, de Scorsese, é a tampa do caixão deste período, que ao meu entender surgiu forte nos anos 60, teve seu clímax durante os 70 e foi enterrado no início dos 80. Falo (ui) de um tempo em que as grandes caixas redondas recheadas de película que saíam da Califórnia - e que chegavam até àquele cinema do seu bairro que já não existe mais - tinham também o objetivo de discutir o que eram os States, apontar suas fraquezas e, em muitos casos, colidir de frente com todos os governantes estúpidos das escalas municipal, estadual e federal. Da polícia de Nova Iorque ao FBI. Os donos do poder, enfim, com as calças na mão. Falo (dane-se o cacófato) de filmes como Dr. Fantástico e Nascido para Matar, de Kubrick, Apocalypse Now e A Conversação (Coppola), Táxi Driver e O Rei da Comédia (Scorsese), M.A.S.H. (Robert Altman), Todos os Homens do Presidente (Alan Pakula), Serpico e Um dia de Cão (Sidney Lumet), Muito Além do Jardim (Hal Ashby), entre tantos outros que não assisti, não lembro ou que desconheço a existência. (só achei os nomes de Pakula e Ashby no Google, não conhecia nenhuma dos dois).

Aluguei há alguns dias O Rei de Comédia, que há muito queria ver e não achava em locadora alguma. Não ri. Não que seja mal feito, muito pelo contrário, mas o contexto em que a dita comédia se insere é angustiante. O drama de carência moral e afetiva por que passam os personagens de De Niro e de sua amiga (cujo nome não sei) é trágico. No fim, com um nó de angústia entalado na garganta, você passa dias pensando se não corre o risco de ficar como aqueles personagens, e faz algumas observações sobre a frieza com a qual os americanos tratam uns aos outros. Enfim, o cinema que te pede para pensar. Brilhante.

Scorsese, o diretor, assume nos extras que produções assim não podem ser realizadas atualmente. O contexto do cinema, segundo ele, mudou. O Rei da Comédia teria sido o último dos filmes que discutiam as carências da sociedade norte-americana do ponto de vista do homem, do ponto de vista da sociedade e, em muitos casos, do ponto de vista dos donos do poder.
De fato, não se vê mais filmes com esta toada, salvo um O Informante aqui, outro Um dia de Fúria ali. Mas nunca mais uma tendência questionadora. Depois que certos dois predinhos desabaram em Nova Iorque então, não fazer filmes que incomodem coisas da política ou da sociedade de nosso Grande Irmão do Norte passou a ser um ato de patriotismo.

Mas por quê, afinal?

Dizem que Ronald Reagan - um ex-ator, lembre-se - não queria seguir os caminhos de Nixon no que se refere a deixar-se parecer o que realmente ele era, ou seja, um tapado utópico, tal qual Nixon. Assim Reagan teria começado a seduzir os chefões de Hollywood, prática intensificada por Bush Pai, Clinton e, sobretudo agora, por Baby Bush. Agora, os donos do poder e os donos do cinema mantém relações carnais que causariam inveja a Carlos Menen, que tanto quis uma algo mais entre a Argentina e os States.

A conseqüência é esse cinemão burrocêntrico que hoje vemos por aí. Um gênio como o Scorsese fazendo algo como O Aviador, uma superprodução burocrática que não quer dizer nada a ninguém. Robert De Niro, talvez o grande ator desta toada pensante dos anos 70, hoje vive de comédia para a família republicana média assistir com o cachorro na sala.

A questão de O Rei da Comédia é a própria questão de Hollywood. Tal qual a frase de Rupert Pupkin, o personagem de De Niro, o cinema de Hollywood foi rei por uma noite, mas tolo por todo o resto de sua existência. A lamentar.

OBS: Pessoalmente acho que temos bons filmes atualmente, mas longe deste contexto político. E duvido que teremos.

Nenhum comentário: