segunda-feira, 7 de julho de 2008

HAVA TEMAKI HAVA TEMAKI HAVA TEMAKI HEIA

Do enviado a Miami, sem gravata amarela

A cena é insólita e pode ser vista à esquerda do meu carro (aluguei um, é mais barato que táxi). A estrada passa a milhas lentas e a paisagem é sempre a mesma. Foi quando avistei este restaurante à beira da pista com a frente negra e algumas estrelas de Davi gigantes na faixada. Estava a 60 milhas por hora mas joguei o carro no acostamento freando tal qual um Charles Bronson em filme dos anos 70, para dar a meia-volta e estacionar na frente do recinto. Aqui vale uma nota: nomeei o carro de Al Flores, nome do funcionário do mês de um supermercado de Coral Gables em que fui no dia anterior. Fazia um calor etíope, não menos etíope que a minha fome, e eram duas da tarde do dia 4 de julho, feriado nacional nos States porque um daqueles caras estampados nas notas de dólares um dia mandou os americanos da Inglaterra saírem vazados do país.

Ao entrar no restaurante, havia muitos judeus, como se supunha, mas alguma coisa estava errada. Uma mesa grande com jovens, todos latinos, parte deles com aquele meio-coco que os judeus colocam na cabeça para não serem confundidos com os palestinos, porque são todos parecidos, talvez os palestinos mais escurinhos, mas ainda assim similares fisicamente, por mais que ambos odeiem ouvir isso, aliás os judeus de origem hispânica são mais escurinhos e, conseqüentemente, ainda mais parecidos com os palestinos...

Mas não desviemos do assunto. Dizia eu que havia alguma coisa errada no restaurante. Estava atrás da mesa dos judeus-latinos: a decoração era toda tailandesa, com aqueles quadros típicos emoldurados nos restaurantes tailandeses, com um velho barbudo pelado sentado em posição estranha com as mãos e os pés juntos. Minha sobrancelha direita se ergueu espontaneamente. Pior: num outro canto, oposto ao que estava a mesa dos judeus e os quadros pastiches da Tailândia, havia um sushi-man, mexicaníssimo, e um letreiro onde dizia os preços do sushi, sashimi, temaki, etc. Ergui a outra sobrancelha e, com uma enorme interrogação pairando sobre minha cabeça, compreendi que teria babado ali mesmo na minha gravata, caso usasse uma. Não entendia nada.

Instalei-me em uma mesa na frente de um velho judeu lendo um livro, possivelmente a cabala. Uma japa de proporções liliputianas veio me atender. Antes de saciar minha sede e fome, tentei saciar minha curiosidade:

- Miss, please... is this restaurant a half jewish and... a half what?

A japinha me olhou com repreensão:

- No, not jewish – aqui ela quase soltou um “Dããã, vacilão” - It´s half japanese and half thai.

Babei na minha gravata imaginária com veemência. Tem-se o seguinte quadro: avistei um restaurante com estrelas da Davi na frente. Dentro dele, quase todos os clientes eram judeus. No entanto, ele não era judáico, e sim meio japonês meio tailandês. Abri o cardápio, que começava com pratos dos japas da Tailândia, depois ia aos japas do Japão mesmo e... Surprise! – se encerrava com pratos kosher e toda uma gama de comida judaica típica.

Como os preços dos pratos kosher eram bem mais caros, optei por uma salada tailandesa e sashimis. A salada tailandesa era tão tailandesa quando eu, mas tinha um molho agridoce que, talvez, com boa vontade, fosse tailandês - possivelmente molho pronto de sachê. De sobremesa, tempura de sorvete. Isso mesmo, não me pergunte.

Paguei os 16 dólares para a japa e, sob o sol etíope, voltei para o carro. Para o Al Flores eu disse, com um cigarro existencial entre os dedos: “Vamos. Nem tão rápido que pareça que estamos fugindo, nem tão devagar que pareça provocação”.

Só volto a restaurantes judáicos acompanhado de meu amigo Henry Sobel, ambos devidamente engravatados, para que nela possamos babar com consistência, quando necessário.

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