segunda-feira, 28 de julho de 2008

OS MUTANTES: CAMINHOS DO CORAÇÃO

Ando tão babeta que escrevi o último post e as pessoas não entenderam absolutamente nada. Vou tentar explicar: eu quis dizer que não tirarei férias do blogue, mas também me reservo o direito de não fazer nenhum sentido. Os assuntos importantes para os caminhos da humanidade no momento são importantes somente para a humanidade. Para mim, o que interessa mesmo são tag clouds, spaceids, hotlist paths, API´s e outras nerdisses impressionantes. Durante todo agosto, você, nababesco leitor, só verá aqui coisas fúteis, como as que eu vou contar no próximo parágrafo, assim que colocar o ponto final aqui, pular uma linha e colocar os dois dedos pra dar espaço da margem, como ensinou minha professora da primeira série.

Não sei se você já teve a oportunidade de acompanhar a levemente retardada novelinha da Record que dá nome a este post. Confesso que não entendi bem o título. Parece que o autor babou na gravata ao tentar abraçar o mundo no nome. Tem mutante no imbróglio, logo contém ficção científica, e já imagino o Tuca Andrada interpretando um Wolverine evangélico. Mas também tem caminhos e tem coração, donde-se deduz que os mutantes vão viajar pra cacete e também vão se apaixonar pela rapaziada. Enfim, diversão pra família inteira.

Inspirado por Os Mutantes: Caminhos do Coração, vou passar a criar títulos de posts que fazem nenhum sentido e que também querem abranger o maior número de assuntos. Deixo aqui sugestões de títulos para as futuras novelas da Record:

- Humberto Martins e Leo Jaime: Não tem mais bobo no futebol.

- Emmanuelle nas Galáxias: A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica.

- A difícil vida dos suricatos: tira a calça jeans e bota o fio dental.

- Lei de incentivo fiscal: Vou-me embora para Pasárdega.


Como diria o Feliz: "E piririri, e pororô".

COISAS PRA SE FAZER NA WEB QUANDO SORRYPERIFERIA ESTÁ MORTO

Não sabe o ilustre leitor que, no começo de 2007, fiz um pacto comigo mesmo. Uma coisa assim meio Paulo Coelho. Fui para minha terra natal, cacei um morcego vesgo no cemitério e, numa noite de lua cheia, fiz um refogadão com o bicho (exagerei na noz-moscada) e o tomei-o emitindo cânticos que aprendi em vidas passadas. Dois fatos resultaram deste pacto: primeiro, me engasquei todo, uma vez que não é possível tomar um refogado ou qualquer outra coisa ao mesmo tempo em que se cantarola uma canção do Jamelão, quanto mais ao emitir cânticos de vidas passadas. Segundo, que passaria os anos de 2007 e 2008 absorto em trabalho árduo, mas que no fim deste período eu teria minha vida pessoal de volta.

Pois bem, este pacto encontra-se em seu auge neste fim de julho e deve adentrar agosto com a quinta engatada, colocando-me um pouco distante deste blogue e de qualquer outra coisa que não seja o trabalho árduo e o álcool excessivo. É por isso que estas mal trançadas linhas andam perigando, dissertando sobre o supérfluo ou, não poucas vezes, sobre o nada.

Para o momento, este blogue não passará por uma pausa e continuará dando vazão a assuntos pouco interessantes, justamente para não perder o hábito da escrita. Em poucos meses, o ilustre leitor poderá conferir, tal qual uma Dalva de Oliveira, que estarão voltando as flores, o que deverá merecer um pileque homérico e uma reformulação do visual bloguístico (migrar ou não migrar para o Wordpress?).

Enquanto SorryPeriferia fica na defensiva, sugere que o fino leitor acompanhe as aventuras de Maurício Savarese e Felipe Corazza na China, uma dupla da pesada que vai aprontar as mais loucas aventuras durante os Jogos Olímpicos de Seul (Pequim? Tòquio? É tudo a mesma coisa).

Aos quatro leitores deste blogue, portanto, digo estas palavras de sapiência filosofal: o que é imortal não morre no final. Rimou tudo e tenho dito.

terça-feira, 22 de julho de 2008

O MAU GOSTO ESTÁ DE LUTO

A morte de Dercy Gonçalves, a última atriz de cro-magnon, é um fato relevante exclusivamente porque deixou Oscar Niemayer, o arquiteto de Stonhage, líder no ranking de geriatria avançada no mundo dos famosos. Veja só, não há um mísero famoso chegando perto dele.

De resto, quem fala que Dercy Gonçalves foi uma pessoa irreverente, como pregam vários atores, está babando na gravata. Ela foi, na melhor das hipóteses, uma atriz de chanchada com algum carisma e uma velha que falava palavrão. Felizmente, todos os meus amigos presentes no último bar compactuam da opinião.

Segue o jogo.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

IT HURTS TO SET YOU FREE, BUT YOU´LL NEVER FOLLOW ME

Quando todos os seus ídolos têm mais de 60 anos, se não há algo errado com você, certamente o há com o restante da humanidade. Mas não seria esta última uma hipótese arrogantemente improvável?

Se Che Guevara saísse vivo da selva boliviana, quem garante que não seria ele quem teria promovido o neoliberalismo na América Latina durante os anos 80?

Será que um sessentão Jim Morrison, ídolo de 9 em cada 10 adolescentes revoltadóides, não estaria hoje dividindo os palcos com Britney Spears?

Por outro lado, se Brizola tivesse morrido na década de 60 e não em 2004, depois de tantas alianças políticas espúrias e tantas frases infelizes, não estaríamos agora carregando cartazes com a inscrição "Brizola Vive"?

O tempo é implacável em abalar valores de muitas das grandes pessoas que estão vivas. Na pior das hipóteses, os anos os transformam em bobões chatos que abrem a boca para exalar o mau álito anacrônico que tomou o lugar de antigas palavras de sabedoria.

Em todo caso, ainda é muito melhor que não ter ídolos.

Ou não?

quinta-feira, 17 de julho de 2008

A HORA EM QUE A CRIANÇA CHORA E A MÃE NÃO VÊ

Sonhei que abandonei fisicamente o local que trabalho e passei a despachar em uma espécie de pousada para pessoas que trabalham. Explico: é como uma pousada, no meio de uma selva, mas com todo mundo com seu notebook e um telefone ao lado. Todos eram obrigados a trabalhar três horas sem parar e, em seguida, ter três horas para beber e comer churrasco - não me pergunte do porquê do churrasco. E era esse esquema todos os dias.

Lembro de que fiz um monte de amigos, nenhuma pessoa que eu conheça na vida real. Lembro que fiz amizade com um sujeito branquelo que ficou bêbado, sumiu e depois de dias voltou de táxi para a pousada, ainda alcoolizado. Quando ele saiu do táxi, o motorista muçulmano acionou um dispositivo que explodiu uma bomba atômica. Me escondi atrás de um muro e vi tudo voar pelos ares, as pessoas, a pousada, exceto eu, a planta que estava ao meu lado e esse inexplicável muro. E fiquei horas assim, atrás do muro, esperando o vento e o clarão passarem, vendo um cogumelo gigantesco se abrir sobre mim, tentando achar uma solução rápida e genial para escapar da massa atômica que me esmagava contra a parede.

É a segunda vez que sonho com bomba atômica, que a visualizo, que vejo minha camisa rasgada por um clarão. É a primeira que acordo com dor de cabeça.

domingo, 13 de julho de 2008

AS ALGEMAS E A CIRROSE

Do enviado a Jundiaí

Ficar bêbado na cidade em que a gente nasce é alugar o próprio cérebro para uma sessão de cinema interna que passa pelos neurônios alucinadamente, às vezes sem sentido, e que acionam porres anteriores, amigos antigos, amores passados, festas, desilusões, as grandes coisas que você fez, as grandes coisas que você não fez e por aí vai. Tudo porque você voltou a andar bêbado pelas mesmas ruas que já te assistiram a fazer isso outras tantas vezes e que parecem te abraçar, como a um vizinho antigo, e dizer "Volte sempre".

Ficar bêbado num país que não é o seu te obriga a dar um Control+ALT+DEL no GPS da sua cabeça pois, ao pensar, no fim da noitada, "agora tenho que voltar pra casa", você cai na gargalhada, porque a sua casa está 8 mil quilômetros longe e seus pés não reconhecem aquelas ruas, sua bexiga estranha aqueles postes limpos e o Bar do Estadão está longe demais pra você amanhecer comendo um pernil.

Ficar bêbado no dia-a-dia é uma forma de deixar os problemas ali na esquina te esperando enquanto você entorna o caneco. Depois vocês dois vão juntos pra casa e no dia seguinte tudo começa de novo, só que com dor de cabeça e de estômago.

Para quem tem superego militarista, cair bêbado cotidianamente é uma competição acirradíssima entre o seu próprio superego e o seu fígado. É como o rochedo e o mar. No entanto, o superego tem a vantagem de só existir no campo das idéias, o que com o passar dos anos faz diferença, além de a cirrose e a hepatite lhe ser indiferente.

Ficar bêbado em tempos de lei seca para motoristas é desistir de sair, comprar bebida pra tomar em casa e ficar absolutamente emotivo com qualquer música, qualquer trecho de livro ou qualquer outra coisa que te faça recordar que o mundo lá fora é tão interessante, mas que, neste exato instante, você não está fazendo parte dele.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

O PETRÓLEO É DELES

Do enviado a Miami, sem gravata amarela

O cucaracha é, antes de tudo, um nababesco. Ao menos os cucarachas que desembarcam nesta grande Itanhaém dos novos ricos latinos que é Miami. Devo registrar que a maioria gosta de ostentar, mas não a maioria absoluta, o que é sempre um alento. Mas eu só quero falar da parte ruim, que é o que dá ibope nessa vida, conforme nos atestaria a Folha de S. Paulo.

A maneira mais comum de ostentação são os automóveis (digo automóveis e já vejo algum chato erguer o dedinho pra mim e dizer que só os velhos chamam carros de automóveis, no que respondo prontamente que gosto de esgotar os sinônimos). Repare: não é tão fácil mostrar pras pessoas que você está usando uma roupa espetacularmente cara. Só algumas dondocas com MBA em peruagem nas ruas de Miami conseguem tal feito com profissionalismo. Relógios, bolsas e correntinhas, menos ainda, e a melancia no pescoço só será chique no dia em que a cotação da melancia for relevante. Logo, sobram os carros (ainda mais porque os homens também ostentam muito).

Outro fator primordial para isso: as ruas de Miami são tranqüilas, as zonas residenciais são deliciosamente arborizadas e o clima é chamativo pra se ficar na rua. No entanto, como na maior parte dos States (dizem), não se encontra absolutamente ninguém nas vias em hora alguma do dia. Resolvi caminhar uma noite dessas. Luar enorme, sem vento, tudo perfeito. Na falta do que fazer, e abismado com a falta do povo nas ruas, resolvi contar quantas pessoas eu encontrava. Resultado: três horas de caminhada, 17 pessoas vistas em plena véspera de feriado, entre 7 e 10 da noite.

Além da febre consumista, ajuda muito o fato de que há pouquíssimas linhas de ônibus, e só há uma linha de trem que deve ser e metade do metrô do Rio de Janeiro, se tanto. Logo, toda família que tem, por exemplo, cinco adultos, tem cinco carros na garagem. Ninguém vai a pé na padoca da esquina. Ou vai de carro ou pede em domicílio.

Pois no país do carrocentrismo, o grande assunto da imprensa nos jornais e nas TV´s não é a eleição presidencial entre o Valdir McCain Espinoza e o Dadá Obama Maravilha, e sim o preço recorde da gasolina: entre 4 e 5 dólares o galão (tudo nos States é em galão, até o iogurte no mercado). Não se fala de outra coisa. Nos programas de debates, a tônica sempre é o que fazer para baixar o preço da gasolina ou desenvolver um outro tipo de motor que faça andar esses carros enormes e beberrões. Eu vi uns três programas que debatiam o assunto: em apenas um uma telespectadora sugeriu que se investisse e se incentivasse as pessoas a usarem o transporte coletivo. Quem respondeu a ela foi o secretário do companheiro Jorge WC Bush para essas coisas, um xicano chamado Carlos Gutierrez. A resposta foi de babar na gravata: “É, esta é mais uma boa sugestão popular, mas eu quero ressaltar que o que vai fazer diferença é o Congresso aprovar a extração de petróleo dentro de nosso país, o que deixaria a gasolina mais barata”. Ele dizia sobre um estado específico, mas eu esqueci qual é – este blog não exerce o jornalismo.

Enquanto isso, essa rapaziada segue nos braços de nababo a comprar essas caminhonetes gigantes, algumas com o dobro de tamanho das que vemos no Brasil. Hummer, aquele jipão desengonçado que era do Exército na Guerra do Golfo e que agora é carro civil, tem um em cada esquina. Isso me lembra uma charge do Ziraldo ou do Jaguar, na saudosa revista Bundas: um cara parava sua caminhonete gigantesca do lado de um menino, que pra ele dizia: “Po, moço, ainda acho que o velho truque do lenço dentro da calça surtiria o mesmo efeito, e ainda é muito mais barato...”

terça-feira, 8 de julho de 2008

(...)Às vezes, na realidade, sonho que estou no inferno. Ou não sonho nada. Ou sonho que me castraram e que, com o passar do tempo, uns testículos bem miúdos, como duas azeitonas incolores, voltam a brotar em minhas virilhas e que eu os acaricio com um misto de amor e temor e os mantenho em segredo. O dia afugenta os fantasmas. Claro, não falo disso com ninguém. Preciso me mostrar forte. O mundo da literatura é uma selva. O preço que pago com minha relação com a carteira são uns tantos pesadelos, uns tantos fenômenos auditivos. Não é tão ruim assim, eu aceito a paga. Se tivesse menos sensibilidade, certamente nem me lembraria mais dela. Às vezes tenho até vontade de ligar pra ela, de segui-la em seu percurso diário e de vê-la, pela primeira vez, trabalhar. Às vezes tenho vontade de me encontrar com ela em algum bar do seu bairro, que não é mais o meu, e lhe perguntar sobre sua vida: se já tem um novo amante, se distribuiu alguma carta proveniente da Malásia ou da Tanzânia, se ainda recebe, no Natal, a gratificação dos carteiros. Mas não o faço. Só me conformo com ouvir seus passos, cada vez mais débeis. Eu me conformo em pensar na imensidão do Universo. Tudo que começa como comédia termina como filme de terror.

Os detetives selvagens, de Roberto Bolaño*. Um excepcional companheiro de viagem.

* Presente da querida Karen.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

HAVA TEMAKI HAVA TEMAKI HAVA TEMAKI HEIA

Do enviado a Miami, sem gravata amarela

A cena é insólita e pode ser vista à esquerda do meu carro (aluguei um, é mais barato que táxi). A estrada passa a milhas lentas e a paisagem é sempre a mesma. Foi quando avistei este restaurante à beira da pista com a frente negra e algumas estrelas de Davi gigantes na faixada. Estava a 60 milhas por hora mas joguei o carro no acostamento freando tal qual um Charles Bronson em filme dos anos 70, para dar a meia-volta e estacionar na frente do recinto. Aqui vale uma nota: nomeei o carro de Al Flores, nome do funcionário do mês de um supermercado de Coral Gables em que fui no dia anterior. Fazia um calor etíope, não menos etíope que a minha fome, e eram duas da tarde do dia 4 de julho, feriado nacional nos States porque um daqueles caras estampados nas notas de dólares um dia mandou os americanos da Inglaterra saírem vazados do país.

Ao entrar no restaurante, havia muitos judeus, como se supunha, mas alguma coisa estava errada. Uma mesa grande com jovens, todos latinos, parte deles com aquele meio-coco que os judeus colocam na cabeça para não serem confundidos com os palestinos, porque são todos parecidos, talvez os palestinos mais escurinhos, mas ainda assim similares fisicamente, por mais que ambos odeiem ouvir isso, aliás os judeus de origem hispânica são mais escurinhos e, conseqüentemente, ainda mais parecidos com os palestinos...

Mas não desviemos do assunto. Dizia eu que havia alguma coisa errada no restaurante. Estava atrás da mesa dos judeus-latinos: a decoração era toda tailandesa, com aqueles quadros típicos emoldurados nos restaurantes tailandeses, com um velho barbudo pelado sentado em posição estranha com as mãos e os pés juntos. Minha sobrancelha direita se ergueu espontaneamente. Pior: num outro canto, oposto ao que estava a mesa dos judeus e os quadros pastiches da Tailândia, havia um sushi-man, mexicaníssimo, e um letreiro onde dizia os preços do sushi, sashimi, temaki, etc. Ergui a outra sobrancelha e, com uma enorme interrogação pairando sobre minha cabeça, compreendi que teria babado ali mesmo na minha gravata, caso usasse uma. Não entendia nada.

Instalei-me em uma mesa na frente de um velho judeu lendo um livro, possivelmente a cabala. Uma japa de proporções liliputianas veio me atender. Antes de saciar minha sede e fome, tentei saciar minha curiosidade:

- Miss, please... is this restaurant a half jewish and... a half what?

A japinha me olhou com repreensão:

- No, not jewish – aqui ela quase soltou um “Dããã, vacilão” - It´s half japanese and half thai.

Babei na minha gravata imaginária com veemência. Tem-se o seguinte quadro: avistei um restaurante com estrelas da Davi na frente. Dentro dele, quase todos os clientes eram judeus. No entanto, ele não era judáico, e sim meio japonês meio tailandês. Abri o cardápio, que começava com pratos dos japas da Tailândia, depois ia aos japas do Japão mesmo e... Surprise! – se encerrava com pratos kosher e toda uma gama de comida judaica típica.

Como os preços dos pratos kosher eram bem mais caros, optei por uma salada tailandesa e sashimis. A salada tailandesa era tão tailandesa quando eu, mas tinha um molho agridoce que, talvez, com boa vontade, fosse tailandês - possivelmente molho pronto de sachê. De sobremesa, tempura de sorvete. Isso mesmo, não me pergunte.

Paguei os 16 dólares para a japa e, sob o sol etíope, voltei para o carro. Para o Al Flores eu disse, com um cigarro existencial entre os dedos: “Vamos. Nem tão rápido que pareça que estamos fugindo, nem tão devagar que pareça provocação”.

Só volto a restaurantes judáicos acompanhado de meu amigo Henry Sobel, ambos devidamente engravatados, para que nela possamos babar com consistência, quando necessário.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

AS VEIAS FECHADAS DA AMÉRICA LATINA

Do enviado a Miami, sem gravata amarela

Pois é. Quis o destino que eu, sempre tão esquerda Jack Daniels, sempre tão quase-revolucionário de botequim, fizesse minha primeira viagem internacional para Miami, paraíso dos aspirantes a Roberto Justus. Cabe-me a ventura de ter vindo a trabalho e não a passeio ou compras – aliás, muito menos a compras, e que me perdoem as 15 pessoas que souberam da empreitada e que tentaram me encomendar quinquilharias. Não, não vesti a gravata amarela, última moda entre os executivos que têm a Flórida como símbolo de status.

Veja se essa vida não é irônica: por ser um vôo de fim de junho e, conseqüentemente, de fim de férias, as Tia Augusta e Stella Barros da vida fizeram o favor de lotar o meu redor de adolescentes nhenhenhéns no avião, todos com destino à Disneylândia. Pior: ainda no aeroporto de Miami, passei duas horas na fila da alfândega americana junto da Hebe Camargo (fotos no Flickr em breve), que, com seu cabelo tão amarelo quanto um pudim estragado, tirava fotos com a rapaziada e distribuía o seu chavão favorito: “Obrigado, gracinha”, “Também adoro vocês, gracinhas”, e por aí vai.

Faz um calor abismal em Miami. Como a temperatura é em Farenheit e eu fugia das aulas de Termologia, suspeito que esteja por volta de 32 graus Celsius (sempre quis ter um cachorro chamado Celsius), sem o menor indício de vento.

Falando em termômetro, dois fatos relevantes ocorreram na América Latina nesta quarta-feira e que de alguma forma me fizeram sentir com força a quentura de nuestra latinidad. Primeiro, o desseqüestro daquela tia colombiana chamada Ingrid Betancourt (a imprensa já torcida pela soltura dela porque não agüentava mais ilustrar estas notícias com as mesmas fotos de seis anos atrás, quando ela foi presa). Segundo, o futebol, com a conquista da Libertadores da América pela primeira vez por um clube equatoriano, a Liga Deportiva Universitaria, a LDU, sobre o Fluminense.

Com a notícia de que Ingrid Betancourt estava livre, muita gente do trabalho parou para ver TV – o escritório está cheio de colombianos aqui, e eles gostam tanto de política quanto nós de futebol. A grande polêmica ficou por conta da discurso de Ingrid, que agradeceu a todo mundo, menos ao presidente da Colômbia, Álvaro Uribe.

À noite, fui com o amigo Alvez ver o Flu x LDU num bar parecido com qualquer um dos Jardins (só que a era comida boa), com uma diferença e uma curiosidade. A diferença é que vi a decisão por pênaltis ao som alto de remixes de Duran Duran, porque eles não desligam a música pra ver o jogo. Não tem jeito, eles não entendem a liturgia do futebol. A curiosidade, que provavelmente jamais vou repetir na vida, é ver a conquista do time do Equador ao lado de ao menos cinco equatorianos fanáticos pela LDU. Ao fim da partida, ficaram todos bêbados, saíram berrando e não paravam de ligar aos amigos no Equador, aos prantos. Eu entendo esses equatorianos. Quando a gente está longe de casa, gosta um pouquinho mais dela.

Na saída do bar, encontramos uma colombiana que trabalha no escritório. Tocamos no assunto Ingrid Betancourt para ouvir, de bate-pronto: “Aquella grã-puta!!!”. A colega ficou uns 15 minutos ininterruptamente falando mal da ex-seqüestrada. A moça em questão é uma uribista fanática, rival político de Betancourt. O fato é que provavelmente a última vez em que a América Hispânica esteve duas vezes com tanta evidência na mídia mundial no mesmo dia foi quando o Francisco Pizarro desceu da caravela e matou uma rapeize morena ali pelas bandas do Peru.

Bom, por hora é o suficiente. Fico aqui durante o 4 de julho - agitar uma bandeira de Cuba durante a marcha e ser deportado ou não? - e no fim de semana, quando pretendo esticar até Palm Beach para tirar fotos na loja onde o Henry Sobel roubou umas gravatas. Talvez eu roube uma amarela. Que o Roberto Justus esteja com vocês.