
Pois digo que até os vira-latas da Vila Olímpia teriam um gingado pomposo a la Miami caso houvessem vira-latas naquelas ruas. Já causou-me extrema preocupação quando uma barata atravessou a calçada na minha frente com um remelexo arrebatador, um gingado superior e empolado que só outras baratas da Vila Olímpia podem ter igual. Cito aqui Nelson Rodrigues ao dizer que daquela barata pendia a baba elástica do narcisismo, como se olhasse para mim e dissesse: "Você não é absolutamente nada perto de uma barata da Vila Olímpia". Fui para casa com um rabo existencial entre as pernas, procurando as razões de minha falência enquanto ser vivo.
Mas o que acima de tudo me deixou estupefacto na fauna olimpiana foi, dia desses, ao chegar ao prédio onde trabalho, notar lá de longe que uma porção de flamingos usando calças jeans se apoderavam da fonte luminosa que dá para a calçada. Ao chegar mais perto, notei que os flamingos em calças jeans não eram flamingos e sim modelos. Foi quando descobri que trabalho no mesmo prédio que a Ford Models e que naquele instante estava havendo um peneirão de modelos para a agência. Sim, peneirão, como esses pra jogador de futebol que toda hora ocorrem na Vila Sônia. Só que de meninas de 14 anos de 1.90 de altura e pesando não mais que seus 18 quilos. Tinha uma ali que talvez chegasse a 20 quilos, mas estava meio deslocada da turma, deu para perceber que as demais a olhavam de soslaio como se dissessem "Ah, essa gorda...".
Subitamente me bateu um flashback. A cena congela e no fundo entra uma nova com as bordas clareadas típicas de novela: Jundiaí, anos 80. O menino Vives de mãos dadas com Papai e Mamãe Vives ao redor do lago do clube Caxambu em uma ensolarada manhã de domingo. Papai e Mamãe Vives dão ao pequeno um pacote com miolo de pão para que ele dê aos patos do lago. O pequeno Vives joga os miolos na beira do lago e dezenas de patos vêm felizes a grasnar e comer, a comer e a grasnar. O menino e seus pais ficam felizes, não mais que os gordos e saudáveis patos do clube Caxambu.
Fim do flashback. De volta à cena anterior, um catatônico Vives observa os flamingos em calças jeans ao redor da fonte luminosa. Ele tem um impulso fortíssimo de ir até a padaria mais próxima, na quadra seguinte, comprar um saco de pães para jogar sobre esses mal alimentados e pedantes flamingos gigantes, e depois ligar para seus pais a dizer "Pai, mãe, estou alimentando flamingos cadavéricos na Vila Olímpia, eis minha boa ação do dia".
Mas a vida não é doce nem bucólica. Saí do transe, observei mais uma vez aquela paisagem bulímica e resolvi ir trabalhar, lembrando de uma famosa chanchada dos anos 50 em que o Oscarito olhava aos céus e dizia: "Obrigado, ó Pai, pelo otários do mundo, que fazem minha alegria de viver".
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