Se o Forum de 2003 foi o da esperança, o desse ano ficou marcado por pessoas falando de lado e olhando pro chão, como na música do Chico. Em grande parte das palestras, nacionais ou internacionais, ficou explícito que a galera vai de mal a pior e que só em muitos anos vai ser possível mudar alguma coisa, se der. No seminário de José Saramago e Eduardo Galeano, o primeiro falou que tem medo do mundo que seus netos encontrarão. Galeano, pra não perder o fundo marxista, disse que é fundamental manter a utopia. E completou: "Pobre do dicionário que não contém a palavra utopia". Foi uma tentativa de manter os ânimos em um patamar aceitável, o que anda meio difícil.
Assisti um seminário do ATTAC, com o título: "Social-Democracia escandinava: ainda é possível?". Fui crente que dali sairia coisa boa - tenho simpatia pela social-democracia. Os palestrantes - membros do ATTAC da Noruega, Índia, Nepal e de Porto Alegre - taxaram: a social-democracia acabou. Não há saída para agora. Se a sociedade se mobilizar, como aconteceu no pós-guerra, daqui a muitos anos o andar debaixo conseguirá equilibrar as coisas, só que de maneira diferente.
Acho que as esquerdas têm um problema muito maior de forma que de conteúdo. Explico: enquanto já existe uma noção por parte de todos de que só com a mobilização da sociedade civil a gente pode chegar em algum lugar, não importa o que você pregue, a maneira como eles dizem isso é no mínimo rudimentar. Não dá pro João Pedro Stédile subir num palanque e gritar "Cuspam nas calçadas das multinacionais", como ele disse há dois anos em São Paulo, por mais que ele tenha razão em dizer isso. Palavras e expressões como "imperialismo ianque", "anti-bush", "morte ao capitalismo" e outras deveriam ser aposentadas. Não dá pra ficar pregando a revolução socialista em todo lugar, pelo simples fato de que ninguém sabe o que é isso. Simplesmente associam com algo muito ruim - e ela pode ou não ser ruim. Nesse ponto o Hugo Chavez foi perfeito: enquanto não tinha moral na Venezuela, quase não falava em socialismo. Simplesmente mobilizava a sociedade com o discurso de mudança. Conforme a popularidade e legitimidade dele foram crescendo, Chavez inseria em seu discurso elementos mais incisivos de esquerda. Agora, no topo, ele fez um discurso em Porto Alegre recheado de elementos socialistas e bolivarianos. Hugo Chavez é tudo, menos burro.
Agora, não dá mais pra agüentar o pessoal da esquerda hormonal, mais precisamente as Juventudes do PT, PC do B, PCB, PSTU, Anarquista e várias outras menores ainda. São as viúvas do Muro de Berlim, que lêem os clássicos da esquerda ao pé da letra. Não dá pra transferir para o nosso momento histórico o que Gramsci dizia no início do século XX, mas apenas utilizar seu raciocínio. Acho que se fechassem a zona pra essa garotada, eles deixariam de ser tão chatos e prolixos. A Juventude do PT é completamente burra: durante a passeata de abertura, José Genoíno pintou na área. Achei que ele ia ser linchado, já que a JPT só fala em socialismo. Mas não, teve gente que chorou de emoção e todos passaram a cantar gritos socialistas, abraçados ao Genoíno. Vai entender essa gente.
Em certa noite, o ministro Gilberto Gil foi até o acampamento acompanhado do Sérgio Amadeu. Foi com o violão, pensou que ia ser ovacionado. Não merecia, e em grande parte não foi. Mas também não era o caso do que fez uma dessas juventudes viúvas do muro de Berlim. Enfiaram o auto-falante dentro do barracão onde estava o Gil e não deixaram ele falar. Queriam discutir a situação das rádios comunitárias. Como não conseguiram, atravessaram tudo. Não perguntaram se os demais que estavam lá se queriam discutir a reforma da legislação das rádios-comunitárias. Foi um horror. O sujeito que queria debater com o ministro ainda se apresentou como sendo do "Grupo Mídia Independente, que está espalhado ao redor do mundo acompanhando o crescimento da revolução". Cadê a revolução, porra, que eu não tô vendo? Ninguém me avisa? O cara vive na quarta dimensão? Pelo menos valeu a pena ver o ministro nervosinho, caindo do salto alto. Afinal, como ministro, ele é um excelente cantor.
Enfim, o Forum foi depressivo, apesar de muitas coisas boas que vi por lá. Mas a viagem em si foi sensacional. Mas isso não é assunto de blog. Mais sobre o forum aqui.
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