sexta-feira, 19 de novembro de 2004

CARLÃO

Nova Iorque. Busão Pines-Aclimation, sentido Aclimation, oito horas da noite. Na subida letárgica da Theodore Sampay, um homem grande e descabelado encontrava-se sentado solitariamente no fundo do veículo. É quando uma moça pequena mas também descabelada e com cara de maluca ultrapassa a roleta e vai sorrindo em direção ao homem grande, que está com o disk-man tocando As the world falls down, de David Bowie.


O homem grande percebe, olha e não reconhece a figura exótica que se aproxima. Acha que não é com ele. Mas ela vem com tudo, tasca-lhe um beijo na bochecha e diz:


- Carlão, tudo bem?


O homem grande não move seu rosto, mas acompanha com os olhos a mulher maluca e descabelada sentar no banco ao lado do seu:


- (silêncio)


A familiaridade com a qual a dita cuja lhe trata o incomoda. É quando finalmente ela parece notar algo diferente com o "Carlão":


- Peraí... você é o Carlão?


- É a primeira vez que me chamam de Carlão, senhora... - respondeu o homem grande, ainda sem se mexer, acompanhando a mulher só com os olhos.


Se o coroinha da Catedral da Sé ficasse pelado durante uma missa lotada e gritasse "I need an exorcist!", o padre não ficaria tão constrangido quanto o homem grande e a mulher maluca ficaram naquele momento. Até o metrô mais próximo, a mulher maluca permaneceu sentada ao lado do homem grande, rindo e completamente desgostosa.


Revoltado, o homem grande continuou sem se mexer.

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