
Antigamente, o sujeito que levantasse o dedinho e dissesse "Estou depressivo" era logo tachado de maricão. No caso das mulheres, a cidadã que contasse pros pais que era depressiva já tomava umas traulitadas na bunda, pra deixar dessas frescuras de gente rica.
Convenhamos, nos velhos tempos as coisas eram complicadas no que tange (sempre quis usar essa expressão) a questões psicológicas. Mas, ao que parece, atualmente a coisa radicalizou para o outro oposto. Hoje em dia não ser depressivo é tão fora de moda quanto usar gravata borboleta, o que, aliás, me lembrou de uma historieta que agora passo a contar.
Um amigo me disse que assistiu certa vez um filme trash em alguma dessas madrugadas em que o sono disputa com a solidão pra ver quem te aporrinha mais. Ligou num desses canais obscuros da TV a cabo que passava a tal película, com enredo futurista.
Era mais ou menos o seguinte: no Planeta Terra, num futuro distante, todos os seres humanos eram homossexuais e se reproduziam via laboratório. Só um sujeito, o mocinho do filme, era hétero, e justamente por isso ele era discriminado e preso. Se não me engano, o objetivo do mocinho no filme era ficar com a mocinha lésbica pero no mucho, provar que as coisas tinham se invertido e voltar a repovoar a Terra pelo método convencional.
Pois bem, não sei o desfecho do imbróglio - e tão pouco quero discutir a retórica do homossexualismo do filme -, mas perceba que não contei essa história de inversão de valores ao léu.
Nos dias atuais, entro no elevador do prédio onde moro e encontro aquelas velhinhas com pinta de serem simpáticas, avós que preparam bolos de cenoura pros netos no sábado à tarde. Mas basta perguntar um "Tudo bem?" pra ter como resposta um ultrajante "Vamos indo, né?", que nornalmente desemboca em frustrações de dores na coluna, preços abusivos de remédios, filhos que só visitam a cada 15 dias, o preço do condomínio que aumentou e outros assuntos que me fazem pensar em subir de escada na próxima vez.
Vejam só, são apenas seis andares do térreo até os meus simpáticos aposentos, seis andares onde padeço de uma imoral depressão alheia que me corrói por horas seguidas. Há uma velhinha em especial - juro que ela é a cara do peru da sadia - para quem me recuso a dar bom dia, tamanha a chateação a que sou submetido caso cumpra com a formalidade.
Mas veja só, esse não é um mal que aflige somente a terceira idade. Sinto cada dia mais que, em muito pouco tempo, vou sair na rua e me deparar com jovens caindo em depressão pelas sarjetas. Na padaria, pedir um pão na chapa será uma tarefa simpática demais para que você seja bem atendido. E o chapeiro então, com um ar de quem passou a madrugada ouvindo Smiths, lhe entregará um pão murcho borrifado com margarina light a te dizer: "Toma. É o que resta da aventura desta vida".
Veja bem, o que me aflige entre o fígado e a alma é esse culto ao depressionismo - adoro neologismos depreciativos. Cada dia mais vejo pessoas engajadas no ato de entristecer-se. Anotem aí: está perto o dia em que eu vou soltar uma gargalhada no bar e ouvirei na seqüência os sacripantas da mesa ao lado a me apontar e dizer, balançando a cabeça para os lados: "Que ridículo esse sujeito feliz".
Eventualmente acordo chateado, pois tenho, segundo último censo realizado no fim do ano, por volta de 6500, 6700 problemas pra resolver, o que me deixa nem abaixo nem acima da média do restante da humanidade. Mas ficar triste é, antes de tudo, chato pacas, e em questão de horas esqueço completamente que acordei com cara de fã de Belle e Sebastian. Simplesmente não entendo como alguém não pode ficar de saco cheio de ficar triste.
Pra resumir a história: pior do que velhinhas que reclamam da coluna no elevador é só gente com 20, 30 anos que reclama de tudo e adora dar uma afogadazinha marota nas lamúrias, por mais cretinas que estas sejam. Porque, quando passarem dos 60, vão olhar pra trás e dizer o quanto foram estúpidos reclamando de tudo. Aí sim é que terão motivos suficientes pra ficar triste.
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