"(...) Mas o que eu queria, na presente confissão, é contar uma experiência muito pessoal. Imaginem que, certa noite, meu irmão, Mario Filho apresentou-me a Carlos Heitor Cony. É exatamente a pessoa: - Carlos Heitor Cony. Jornalista, polemista, romancista, etc. etc. Eu já o conhecia de nome e de vista. Vira-o, uma madrugada, nos Três Patetas, junto ao balcão, e de cachimbo. Até o momento em que fomos apresentados, Cony era um cachimbo. Não uma pessoa e não um artista. Um cachimbo.
Bem me lembro da nossa primeira conversa. Eis o que eu pensava - que sujeito indesejável, irrespirável e cínico. Eis a palavra - cínico. Achei Carlos Heitor Cony de um cinismo abjeto e total. E não entendia por que Mario se afeiçoara a ele e tão profundamente. Dizia-me: - O Cony! O Cony!". Em suma: - com meia hora de conversa, já não tive a menor dúvida: - era um canalha. Seu riso me ofendia e me humilhava. Na primeira pausa, aproveitei para me despedir. Saí, desesperado e nem sei por que desesperado. Afinal, não tínhamos nenhuma relação especial, nenhuma intimidade. Mas sentia uma angústica intolerável, como se a simples presença de Carlos Heitor Cony exalasse o tifo, a malária, a febre amarela.
E quantas vezes, depois disso, Mario me falou de Cony. Sim, o meu irmão continuava achando o amigo um maravilhoso ser. Eu não entendia nada. Mas senti, sempre, sempre, que Mario ia ser, e para sempre, amigo do canalha. Até que, uma madrugada, às quatro e pouco, bate o telefone. Lúcia atende: - Mario acabara de morrer. Corri para vê-lo. Na véspera, tomamos café juntos, no bar da esquina. E ele combinara, para o dia seguinte, uma chopada com o Hélio Peregrino. Debrucei-me sobre o irmão. As mãos entrelaçadas e com que estremecido amor. Tive pudor de beijá-lo.
Bem. Quero falar, não de mim, mas de Carlos Heitor Cony. Chegou, na casa de Mario, às seis da manhã. Pára diante de mim, abre os braços, grita: - "Como foi isso?". O espanto veio antes da dor. Eu via, ali, um outro Cony, absurdo, irreal, jamais concebido. E, depois, ficou ainda, algum tempo, vagando entre mesas e cadeiras - tão órfão de Mario. Foi aí e só então que entendi que a amizade os unia. O irreal, o absurdo, era o Cony cínico, o Cony pulha, o Cony obsceno; o verdadeiro Cony é o da orfandade brutal. Vi-o desabar. Afundou o rosto nas duas mãos chorou alto, chorou forte. E, naquele momento, eu me tornei seu irmão, para sempre. Era, sim, o falso canalha."
Nelson Rodrigues, 25.06.1968.
Bí Quyết Để Trúng Jackpot Nhận Thưởng Khủng Tại Sodo66
-
Khám phá bí quyết để trúng jackpot giành chiến thắng lớn trong trò chơi
slot luôn là đề tài “nóng bỏng tay” trong cộng đồng người chơi tại Sodo66.
Đây khôn...
Há 5 semanas