segunda-feira, 30 de maio de 2005

LOCOMIA

Flagrante de Felipe Corizza durante a manifestação perobo-baitolística na Paulista, onde declarou: "Ano que vem eu me fantasio de motoboy".

Rússia. Avenida Angeliskaia, endereço tradicional da cidade de San Pavel, metrópole decadente. Domingo à noite. Um pseudo-jornalista cansado e faminto havia chegado horas antes de um evento universitário na cidadade interiorana de Guataringuetsk. Ele liga para a pizzaria que dista 60 metros de seu apartamento.

- Fala, tio. Meia muzzarela, meia calabresa. Vai logo que eu tô com fome.

- Em 20 minutos o motoboy tá aí apertando o botãozinho.

O pseudo-jornalista arruma a mesa e senta-se junto dela, com o guardanapo enfiado na gola, e passa a contar os minutos. Segurava os garfos tentando pensar em outra coisa que não fosse o estômago em autofagia. Mas conforme o tempo passava, ele notou que a pizzaria provavelmente utilizava o sistema horário de Plutão, apesar de distante apenas 60 metros de onde ele engasgava com o excesso de saliva.

Cinqüenta minutos terráquios depois, um dedo finalmente apertou o botãozinho.
- Porra, seu Motoboy, demorou pacas!

- Alemão, deixo te contar! A CULPA É DAS BICHAS! ELAS DOMINARAM A CIDADE! TEM BICHA EM TUDO QUE É CANTO, EU NÃO AGÜENTO MAIS DESVIAR DOS VIADOS POR CAUSA DESSA PARADA GAY! EU FUI FAZER UMA ENTREGA NA PRAÇA DA REPÚBLICA E TAVA TUDO LOTADO! TÔ FALANDO, SE COMEÇAR A ATRASAR MUITO AS ENTREGA, EU VOU PASSAR POR CIMA, BANDO DE VIADO FELADAPUTA!!!!!!!!!!!

Apesar de machão, o pseudo-jornalista sentiu-se solidário à causa de seu amigo Felipe Corizza e não deu gorjeta pro cidadão. Ele não vê motivos para que pizzas e gays não possam coexistir pacificamente.

quarta-feira, 25 de maio de 2005

WHEN ALL THE NERDS GO MARCHING IN

Anri: "Eu também sou fã do Guerra nas Estrelas"

Há algumas épocas do ano em que os nerds se manifestam. Mais do que o necessário, eu diria. É quando os mais esperados jogos de RPG tomam as prateleiras, ou quando um desses filmões que duram três horas chegam aos cinemas, como Guerra nas Estrelas, Senhor dos Anéis e Harry Potter, só pra citar os mais famosinhos. Desde o lançamento desse último Guerra nas Estrelas, por exemplo, é possível identificar nerds nas avenidas, ônibus e repartições públicas só pelo tamanho do sorriso. É como se dissessem: "Vencemos. Não sabemos o que, mas vencemos".

Aliás, esta é a única época do ano que eles tomam as ruas, feito andorinhas que voltam após passar o inverno em outro hemisfério. Porque nerd que é nerd, o nerd utópico, só sai de casa para o trabalho/escola, e deste para casa. O Darth Vader e sua espadinha de picolé da Gelatto representam para ele o que Roland Garros é para o tenista profissional. A Copa do Mundo do nerd utópico é ver o Mestre Yoda na telona. Para isso ele sai de casa, correndo o risco de tomar aquela bolinha de papel na cabeça daquele sujeito que sentava atrás dele na 6ª série.

Creiam vocês que há subdivisões do nerdismo, embora tudo no fundo seja a mesma coisa. Uma amiga nerd me disse que ela é nurd, e não nerd (ou seria o contrário?). Ela escangalhou-me um argumento de número seis que na verdade é meia dúzia: os nurds são os internautas viciadões ou algo assim, enquanto os nerds são bons em matemática. Eu fico imaginando como chegaram a esta conclusão de importância hegeliana, filosoficamente ímpar na história da humanidade. Vejamos: tem-se uma convenção a ser realizada n´algum porão de um nerd utópico do Vale do Silício (onde, presumo, tudo começou). Todos reunidos, jacobinos nerds de um lado, girondinos nurds do outro. "Nós não gostamos de vocês", grita um lado, "Bancada nurd, pequenininha, tua torcida cabe dentro de um fusquinha", responderia o outro. Segue votação. O resultado é a divisão. Quebra-quebra na saída, denúncia de fraude por parte do lado perdedor.

Mas o que mais estranho é o chamado orgulho nerd. Você já viu alguém ter orgulho da sífilis? Imaginou um cidadão ruandês ter orgulho da guerra civil? Pois é, no entanto, os nerds têm orgulho de ser nerds. Do ponto de vista do marketing, a coisa tem dado resultado: belas mulheres têm se transformado em nerds, e assumido essa fraqueza com freqüência. Em outras palavras, como diria Celso Unzelte, a banana tem constantemente comido o macaco.

Tenho medo disso. Belas mulheres hoje, o mundo amanhã. E quando isso acontecer, pegarei em armas para combatê-los. Nem que a arma seja a tradicional bolinha de papel, ou, para devolver na mesma moeda, um reles picolé colorido da Gelatto.

E tenho dito.

terça-feira, 17 de maio de 2005

A MÃO QUE AFAGA É A MESMA QUE APREDEJA

Você poderia me passar o xampu?

Escrevo estas linhas com os dedos da galhofa e as teclas da melancolia, e mal sei o que esperar deste conúbio. Digo que na última noite sonhei com um chuveiro. Ele estava lá, branco e límpido acima de mim, jorrando água fresca por toda a minha extensão. Acordei suado e resolvi tomar um banho. Faz sentido. Se em algum lugar o calor é anti-ético, este lugar é aqui. Sonho com banhos o dia inteiro.

Abre adendo. Faz 24 anos que tento corpulentamente ser sutil. Faz 24 anos, também, que não me deixam ser corpulentamente sutil. Não, meu caros, nunca servi pra ser beque central, jogador de basquete ou de rugby. Lamento informar que tampouco quero ser bom de briga de bar, não era o bam-bam-bam da minha turma nem penso em ser estivador no porto de Santos.

Tira esse sorriso bobo e clichelento de seu rosto. É verdade que algumas crianças, ao me verem, saem correndo, pois, com esse tamanho, talvez eu seja o iete em pessoa, uma versão terrestre do Monstro do Lago Ness ou, simplesmente, o homem do saco. Confesso que isso me incomoda. Mas enfim, apesar deste detalhe, entendo que lutar contra o pejorativo quanto ao meu tamanho tem sido a eterna luta do rochedo contra o mar. Fecha adendo.

Pois bem, eu entrava no banho após acordar. Tirei a roupa. Segue música erótica. Entrei no chuveiro, que, por sua vez, é menor do que eu, o que obscurece a higienização capilar, se me permitem dificultar o léxico neste trecho. Ao fechar a porta do box, ela decididamente optou por emperrar. Eu só quis dar um empurrão. Juro por toda a história da higienização humana que eu só quis dar um empurrão para que ela me obedecesse. Foi quando parte do box cedeu, e eu me peguei com a porta na mão, feito figurante de vilão em finalzinho de fita de James Bond. Em outras palavras, eu, o iete, arranquei a dita cuja, e parte do box ruiu. Fim da músico erótica.

Tentei chegar a um consenso junto ao combalido conjunto do box que, felizmente, era de plástico, não de vidro. Arrumei daqui, encaxei dali, mas nada que pusesse o bendito de pé. Investi, desisti. Se há sorte eu não sei, nunca vi, já diria Renato Teixeira. Encostei a porta na parede e fui tomar meu banho, agora com a bucólica visão do bidê a me observar, calado. Eu já tomara banhos mais felizes.

O clichê venceu a esperança. A eterna luta do rochedo contra o mar.

sexta-feira, 13 de maio de 2005

SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA

Não, não é o Newton Carlos

A Companhia das Letrinhas está lançando vários livros infantis do Érico Veríssimo. Eu nem sabia que eles existiam. Me bateu o comichão.


Em Os Três Porquinhos Pobres (1936), Sabugo, Salsicha e Lingüicinha são vizinhos de quintal do burro de óculos, do galo que tem um despertador na barriga e de um cachorro que tenta em vão caçar suas presas favoritas. Eles fogem, vão ao cinema assistir ao desenho dos estúdios Disney sobre porquinhos trabalhadores e acabam presos.


(...)


O teceiro bom motivo (para lê-lo) é o talento do escritor gaúcho em envolver o leitor na trama. O estilo de Veríssimo é simples, mas encadeado, sem deixar de lado nenhum elo narrativo. Como no célebre Cem Anos de Solidão, o leitor se perde na rede familiar dos Terra Cambará (em Um Certo Capitão Rodrigo).


Mônica Rodrigues da Costa, Revista Entre Livros, maio/05.


Érico Veríssimo deveria ser obrigatório no primeiro bimestre do primeiro ano da faculdade de jornalismo. Minha concepção textual se divide em antes e depois que li o primeiro volume de Solo de Clarineta. É claro que todos nós desse circuito de blogs estão andares abaixo dele, mas fica como inspiração.


Em dezembro, Érico completaria 100 anos de vida. Um post aqui sobre o assunto será benvindo. É mais do que uma questão de elegância. É um agradecimento.

quinta-feira, 12 de maio de 2005

DA FALTA DE ENVERGADURA MORAL E OUTROS PARÂMETROS PARA A ESPOLIAÇÃO EXACERBADA

O sociólogo bielo-russo Fernanditri Vivensky (à direita, assinando o papel), durante noite de autógrafos em Minsk, nos anos 60: chupa Mãe Dinah

Você não sabe porque não leu, mas no fim dos anos 60 um sociólogo bielo-russo chamado Fernanditri Vivensky escreveu uma obra intitulada "O futuro da esquerda mundial na era de sua reprodutibilidade técnica: o importante é participar, ter charme e ser feliz", um livro racionalista, estóico e atual no que concerne à utopia resumida pela frase "Para que todos sejam um". Abre parênteses: frase enigmática essa. Possui três sentidos básicos: 1) É o lema do comunismo e do bem-estar social; 2) É o lema essencial do evangelho de São Lucas e; 3) É o lema da União Internacional dos Onanistas, a famigerada UNIONANI, que remete à mitológica briga dos cinco covardes contra um valentão abençoado pela deusa Onanis. Fecha parênteses.

Você não sabe porque não leu, mas a única obra deste ícone da esquerda anônima bielo-russa adiantava alguns fatos que já engatinhavam à época e que anos depois se transformariam em verdades factuais, comos o fato de que o socialismo, podre como estava, ruiria, que John Lennon um belo dia passaria numa padoca da Quinta Avenida e constataria que o sonho acabou, da mesma forma que adiantava que o ex-líder estudantil e atual cafetão político Lindberg Farias viria a se emocionar ao ver Edmundo contratado pelo anti-hiperbólico Nova Iguaçú Futebol Clube.

A questão essencial do legado de Vivensky é: por que a esquerda do século vinte e um cumpriria tão bem seu papel quanto um palhaço que, ao apresentar-se para a platéia circense, a faria chorar de tristeza? Mais que isso. Estudiosos da Academia de Sociologia Exótica de Minsk crêem que o cerne do pensamento vivênskico é: o que é ser de esquerda no século vinte e um?
Eis uma pergunta tão simples quanto complexa. Simples porque sabemos o que é ser de esquerda para essas pessoas nos dias atuais. Complexa porque a resposta é de terrível constatação, a ponto de deixar nossos queixos fazendo companhia ao umbigo. Ou, como diria aquele filósofo da novela Torre de Babel: "Jamanta explodiu o shops. Bum!"

Fernanditri Vivensky se referia a gente como Joschka Fisher, atual Ministro das Relações Exteriores da Alemanha. Alguém que passou maio de 1968 comendo feministas e explodindo volkswagens com coquetel molotov nas ruas de Stuttgart. Hoje ele controla o maior Partido Verde do mundo, o alemão, e se diferencia da direita de seu país da mesma forma que um joão-bobo se diferencia de sua imagem frente ao espelho. O Partido Verde poderia se chamar Partido Azul, Roxo ou Cor-de-burro-quando-foge que não faria tanta diferença assim. Stupiden Uber Alles, se um neologismo saxão é permitido.

Vivensky também poderia comentar sobre gente como o ex-premier francês Lionel Jospin, figura fundamental da esquerda do país mais categoricamente à esquerda do mundo. Alguém que apagou de sua biografia o fato de ter sido trotskista quando jovem, uma vez que isso pegava mal para um político moderno que abriu as portas de sua casa para a Caras francesa. Repare que pega mal ter sido trotskista quando todos os estudantes eram politizados. O que pega bem é pintar na Caras francesa quando o quoficiente moral dos estadistas mundo afora se nivela ao mesmo patamar de um dobermann bem treinadinho. Jogue a liberdade, a igualdade e a fraternidade ali no limbo para Jospin buscá-las, mas não espere que ele as traga de volta na boca com o rabo a abanar. O mais provável é que as enterre por lá mesmo, o que talvez explique o fato dos franceses gostarem tanto de cachorros.

O sociólogo bielo-russo também poderia se referir a um sapo barbudo metido a Luiz XVI chamado Luiz Inácio Lula da Silva, aquele que talvez cometeu o maior estelionato eleitoral da história brasileira, desde o pleito para síndico da Santa Maria, da Pinta e da Nina até a última disputa para a equipe de bombeiros do 5ºandar da Cásper Líbero. O homem que passou 30 anos pensando e repensando a mudança, o homem que prometeu 10 milhões de empregos, a erradicação da fome e uma corrida na reforma agrágria, tudo em quatro anos, ao dizer que a esperança, enfim, triunfiaria sobre o medo. Dois anos, um Romero Jucá, um Renan Calheiros e um Antônio Palocci depois, a esperança claramente ficou com medo e saiu chorando a dizer: "Assim eu não brinco mais".

Você não sabe porque não leu, mas Fernanditri Vivensky foi levado para a Gulag siberiana pelas autoridades soviéticas e de lá nunca mais dele se teve notícia. Seu livro "O futuro da esquerda mundial na era de sua reprodutibilidade técnica: o importante é participar, ter charme e ser feliz", que mistura Lênin, Paiva Netto e Mãe Dinah, foi recolhido das duas únicas livrarias de Minsk que o colocaram à venda todos os 16 exemplares produzidos. Eles ficaram nas praleteiras por apenas duas horas daqueles anos 60 até serem recolhidos pela KGB. Dizem que grande parte foi incinerada, mas que Ken Livingstone, o prefeito esquerdista de Londres, possui um deles, em sua cabeceira. Margareth Tchatcher, Carlos Menem e Pepeu Gomes teriam outros exemplares.

Os dois primeiros guardariam seus volumes em cofres ultra-secretos; Pepeu Gomes o teria usado para bolar baseado e, com a inspiração, composto o hit "Eu também quero beijar".
De fato, somente Livingstone, Tchatcher, Menem e Pepeu Gomes sabem qual é a derradeira conclusão de Vivensky: a esquerda não se reinventou, simplesmente virou a direita com vergonha, mas não perdeu de vista o "Para que todos sejam um". Apenas mudou o seu foco: o anseio pelo bem de todos ficou para trás. Mas a idéia do onanismo moral permanece mais vivo do que nunca.

segunda-feira, 9 de maio de 2005

RCHOS OF THE BUNNYMAN

"Para reconquistar a mulher de sua vida, ele partiu para a maior de todas as viagens, ao interior de si mesmo".

O Zahir, Paulo Coelho.

Ninguém sabia, mas o enredo da nova aventura do mago coelhístico trata na verdade de uma endoscopia.

sexta-feira, 6 de maio de 2005

TODOS ESTÃO SURDOS

Karen Cunsolo é uma das mulheres da minha vida. Me sinto à vontade pra dizer isso, uma vez que ela é mulé do meu brother Richard Muniz. Nesta sexta-feira encerro um ciclo de seis semanas trabalhando um andar abaixo dela, no qual todos os dias tomamos chocolate na sala de café ou comemos pizza na padoca da esquina.

Eu e Karen Cunsolo somos cúmplices de pensamentos politicamente incorretos e de piadas pesadas. Quando um elemento ordinário pinta na área, eu levanto a sobrancelha daqui enquanto ela pisca o olho de lá. Ao mesmo tempo.

Nesta sexta-feira eu vou ficar mais triste. Acostumei com essa presença pequena porém gigante no meu cotidiano. Como no início de ano, nos encontraremos provavelmente apenas nos bares da vida, uma vez por mês, talvez menos. E como eu lamento isso.


E ela não é a única que eu lamento.


Às vezes penso que deveria, por exemplo, passar seis semanas ao lado de Gabriel Falcione. Pra discutir o Palmeiras, a Verrazano-Narrows do Gay Talese ou, simplesmente, a vida. O mundo deveria estar cheio de estelionatários como Gabriel Falcione.


Da mesma forma, por onde anda Rodrigo Joselito, que sequer deu-se ao trabalho de me adicionar no msn? Por que não passamos benditas seis semanas voltando da Benedito Calixto completamente bêbados ao amanhecer, como em tempos passados? Por que eu nunca mais o espanquei quando ele cantou bêbado e não deixou ninguém dormir no meu apartamento?


Eu poderia citar também o próprio Richard Muniz, meu quase companheiro de Timor Leste, ou as siamesas Geiza e Maíra, ou ainda Daniel Patire, ou tantas outras pessoas as quais tenho mais afinidade do que aparento. Se eu fosse um cara menos displicente, daria aqui com todas as honras a lista completa de todas aquelas pessoas com quem converso menos do que deveria conversar, com quem bebo menos do que deveria beber, com quem deveria passar seis semanas com a mesma cumplicidade com a qual passei com Karen Cunsolo.


E na falta de todas essas possibilidades, a Karen fica como símbolo. Nesta sexta-feira ela representa pra mim o que todo esse grupo de pessoas sempre significou. Muito do que sou, e principalmente muito do que quero ser, terá sempre como foco essas pessoas.

Que não esqueçam disso.