sábado, 30 de dezembro de 2006

SEJA MODESTO QUANTO A SUA FALTA DE TALENTO



Fim de ano requer retrospectivas. Não falo - ui - sobre aquela sucessão de clichês pseudo-poéticos que é a retrospectiva de fim de ano da Globo. Mas sabe como é, o ano termina, você olha com um sorriso amarelo pro seu presente de Natal (uma caixa de ferramentas, um jogo de panelas, essas coisas) e fica imaginando que, há muitos anos, você esperava aquele vizinho gordo se fantasiar de Papai Noel entrar pela porta. Você se fingia de surpreso com a presença e avançava no pacote que ele tinha em mãos, como se aquilo fosse a última camisinha do bacanal. Após minutos pensando em episódios do tipo, você chacoalha a cabeça, pensa que está ficando um tanto velho e automaticamente aperta o botão "recapitular fases da vida" no teu cérebro.

Hoje peguei-me lembrando da sétima série. Aulas de História. Professora Eliana, gorda, alta e de semblante divertido, com óculos quadrados que iam das sobrancelhas até as maçãs do rosto. Apelidei-a à época de Prof. Hipopó, em homenagem à bolacha recheada de mesmo nome, que tinha um hipopótamo simpático desenhado em cada unidade - não que ela soubesse do apelido, é claro.

Foi com a adorável Prof. Eliana que tive a descoberta mais interessante da minha vida escolar: um senador da Roma Antiga endoidou de vez e botou um cavalo como senador. Gostei da atitude caprichosa do tal rei. Lembro que disse em aula que, caso um dia fosse eleito imperador do Brasil, elegeria como senador o Pretinho, antipático pequinês preto do meu vizinho, que anos mais tarde morreria por complicações das hemorróidas.

Hoje creio piamente na saúde mental deste imperador romano. Aqui em Buenos Aires, Fernando Collor foi eleito senador na esteira de nomes fantásticos, como José Roberto Arruda e Marcelo Crivella, entre outros, que só não relincham por absoluta falta de modéstia.

Era uma questão de confiança, essa do Imperador de Roma. O Senado exigia alguém em quem ele confiasse. Se ele não confiava em ninguém, por que não seu cavalo? Na pior das hipóteses, o bicho seria discreto e não faria fofoca, o que já é um grande lucro em se tratando de conselheiros.

Mas falta de bons conselhos não é exclusividade de nós latinos. Veja os States, por exemplo. O presidente George WC Bush não tem amigos. Aliás, ele mesmo tem um semblante animalesco, semi-eqüino talvez (posso imaginar a quantidade de feno que ele tem que comer para fazer aquele olhar que só os idiotas sabem fazer enquanto discursam). Se ele tivesse um conselheiro razoável, este diria a ele para intervir nesse teatrinho não muito simpático que virou o julgamento do nosso Saddam Hussein - digo nosso porque Saddam é um cara durão, como este escriba, praticamente um brother.

O raciocínio é simples: Saddam preso manteria alguns sunitas masoquistas dizendo que estão com saudades do governo dele, nada além. Agora, Saddam enforcado por um tribunal patrocinado pelos States significa transformá-lo em mártir também de muitos árabes que não vão com a cara dos invasores brancos - Saddam já é mártir de nós, tuff guys, juntamente com o Jece Valadão, que já se foi por conta de uma parada cardíaca feminista qualquer.

Enforcado, Saddam vira sonho ideológico de uma quantidade exorbitante de jovens árabes que tiveram um primo, uma tia, um vizinho morto por um míssel made in America, e que antes não viam nada de muito instrutivo nele.

Enfim, nada que um pangaré bem treinadinho não consiga entender. Ou como diria Feuerbach: o pior cego é aquele que não consegue enxergar.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2006

O QUE É IMORTAL NÃO MORRE NO FINAL


Não, esses são Junior e Sandy, e não um casal de pôneis

Eu fico triste. Seria capaz de encontrar com Fernando Henrique Cardoso na rua e, ao invés de esbofetear aqueles agressivos lábios de suvaco, empapar-lhe os ombros por conta de minhas lamúrias. Efe Agá, meu bom Efe Agá, explico o motivo de minha desilusão: li no jornal que a ex-atriz e ex-virgem Sandy - lembra dela? Aquela uma que tem um hamster de estimação chamado Junior - fez um show com Marcelo Bratke, um sujeito que se diz de formação clássica, onde teria cantado de Villa-Lobos a Cole Porter e Gershwin. Enfim, como diria o locutor das propagandas da Sessão da Tarde, uma rapaziada da pesada que aprontou as mais altas aventuras na música do século passado, e que costuma estar em uma órbita espacial muito além do que a navezinha da Sandy consegue chegar.

Confesso que não dormi desde então. Fiquei perambulando pela casa a vagar pelo assunto com a lamparina na mão, tal qual Diógenes. Diz Marcelo Bratke: "Escolhi a Sandy por diversos motivos: primeiro, porque é muito afinada. Além disso, ela tem um timbre de voz muito interessante. Quando ela interpreta It's Wonderful, de Gershwin, a sensação que dá é que estamos na Broadway na década de 1930" (leia a matéria completa, escrita por um repórter conhecido como notória fanchona no meio artístico).

Apertemos a tecla SAP da hipocrisia: Bratke escolheu Sandy porque ela dá ibope. Sandy, por sua vez, escolheu Bratke porque este daria a ela a chancela cult e, talvez, porque o Junior se enroscou no pescoço dela e não quis mais pensar em nada.

É por isso que eu comemoro a existência de Reginaldo Rossi, essa grande figura que faz o que convencionou-se chamar, entre meu grupo de amigos, de MPBM - Música Popular Brasileira Mesmo.

Reginaldo Rossi adorava uma flertadazinha marota com o erudito. Na canção Gênio Cabeludo, de 1972, acho, o Rei Ginaldo relatava um sonho que havia tido com Beethoven, onde este dava conselhos a ele sobre como fazer sucesso. "Beethoven também era cabeludo, desligado e ainda surdo, mas foi um grande campeão". A canção até se inicia com o PAN PAN PAN PAN que está para a música do compositor alemão assim como a marreta biônica está para o Chapolin Colorado: é a marca registrada.

Em outra canção, A raposa e as uvas, esta mais lírica, Reginaldo Rossi usa a fábula de La Fontaine (descobri isso muito mais tarde) para contar dos tempos em que ele freqüentava bailinhos com o intuito de dar um tapa na peruca da mulherada. "E tudo que a gente transava eram três, quatro cubas, eu era a raposa e você era as uvas, eu dentro do teu corpete querendo pular".

Reginaldo jamais se deu ao trabalho de pretender ser mais do que era, um cantor popular, brega e divertido, por mais que usasse referências ditas "cultas" em suas letras. E ser um cantor popularesco não faz dele uma figura ilegítima da música, muito pelo contrário. Ele faz bem o que propõe.

Sandy já não. Estava tudo bem enquanto ela cantava a tradução da primeira menstruação de Celine Dion - Eu cresci agora, sou mulher, tenho que encarar com muita fé. Era o água com açúcar que cativava as adolescentes virgens que sonhavam com príncipes encantados, e os garotos de 14 anos evangélicos que sonhavam junto ao travesseiro um dia tirar a pureza da Sandy.

Mas Sandy cresceu. Dizem até que não é mais virgem. E para mostrar ao público que ela ainda existe, enfia as cordas vocálicas onde não deveria. No fundo, é a mesma estratégia da Britney Spears que, no outono do pós-sucesso, tenta aparecer na imprensa se casando em Las Vegas uma vez por mês.

À Sandy restam as sábias palavras do filósofo Walter Benjamin: "Quem nunca come melado, quando come se lambuza". Nunca é demais ser modesto quanto a própria falta de talento.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

E ERA O SAPO DENTRO DO SACO, SACO CUM SAPO DENTRO, SAPO FAZENDO PAPO, PAPO FAZENDO VENTO



Gostaria de compartilhar uma observação científica absolutamente inútil.

Subia eu a Alameda Casabranca ao voltar do trabalho na noite deste domingo (poupem-me da piada marota de que estaria bolinando a rapaziada na calçada, por obséquio) quando, ao ouvir o coachar dos sapos dentro daquilo que - dizem - é um parque, o Trianon, tive um estalo acadêmico tal quando a famosa jaca pendeu na cabeça de Newton.

Explico. Não existem sapos num raio de algumas dezenas de quilômetros do Trianon, donde conclui-se que os anfíbios ali presentes o estão desde a criação do parque, lá se vão mais de 114 anos. É notório também que a quantidade de sapos existentes por ali não deve alcançar a casa de umas humildes centenas, todos cheios de lascívia a coachar com veemência para as fêmeas nestas noites suadouras de dezembro.

Aí me ocorreu a possibilidade de que todos essa sapaiada se acasalando entre si há mais de um século provavelmente gerou uma eugenia que deixaria Joseph Mengele orgulhoso. Deve ser um tal de comer a mãe, a irmã e a tia que Freud, Jung e outros punheteiros de renome se esbaldariam em teorias conspiratórias chatíssimas.

Por fim, gostaria de terminar este post a concluir algo profundo a respeito, mas não sou cientista, psicólogo nem nazista, donde conclui-se coisa alguma. Apenas gostaria de dizer que me aguçou a curiosidade de entrar neste parque para conhecê-lo, e isso mais uma vez não tem nada a ver com aquela rapaziada que fica mostrando a bunda na calçada, por favor. Se não confiam na minha proba sexualidade - sou um cara durão, um dos dos últimos machões à moda antiga - ao menos confiem no meu bom gosto.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

AS MELHORES RESPOSTAS PARA AS PIORES PERGUNTAS

14 de dezembro, data cabalística! Foi em um 14 de dezembro que Jundiaí foi fundada, foi em 14 de dezembro que nasceram Nostradamus, Malatesta e Michael Owen, foi em um 14 de dezembro que George Washington saiu da vida para entrar em uma notal de papel.

Em comemoração esdrúxula e absolutamente sem sentido sobre esta data que não quer dizer nada para ninguém - exceto, talvez, aos também falecidos filhos de George Washington, que por um bom tempo choraram as pitangas nesta data - deixo aqui um post publicado em outro 14 de dezembro, o de 2004. Preciso dizer que estou bêbado?

*Tudo o que você queria perguntar ao autor do blogue e que nunca mais vai ter coragem de publicar:

Pergunta: Como você é grande! Sua mãe dava fermento pra você quando era pequeno? Hahaha!
R: Na verdade eu nasci em Chernobyl. Eu era uma criança normal até aquele fatídico abril de 1986. Eu brincava no reator 4 da usina quando avistei um botão com os dizeres "не выдвиньте это". Só que eu nunca falei russo e apertei. Aí saiu um pozinho verde do reator e eu nunca mais parei de crescer.

Pergunta: Tanto tempo assim internado? Mas como você machucou seu joelho?
R: Foi na Guerra do Vietnã. Eu e os rapazes subíamos o delta do rio Mekong quando fomos surpreendidos por um grupelho de charlies mother fuckers. Tomei um tiro de UZI no joelho esquerdo que me rompeu o ligamento cruzado anterior. Passei um mês internado na Santa Casa de Hanói até ser transferido para a Beneficência Portuguesa, ali pertinho da 23 de maio.

Pergunta (no elevador): Tá calor hoje, não?
R: É verdade. Isso é ruim. Na última vez que fez tanto calor assim, os ratos começaram a sair da caixa d´água do prédio e invadir os apartamentos. Eu mesmo fui mordido três vezes ao tentar expulsar uma família inteira que tomou conta do meu bidê.

Pergunta: Mas então você é o caçula dos quatro irmãos? Aposto que é o mais mimadinho, não é? Hahaha!
R: Na verdade não. Eu fui adotado. Meu pai me achou numa lata de lixo lá no Glicério. Me levou pra casa dele, onde eu recebia comida em troca de trabalhos forçados. Não que me importasse em receber a comida por baixo da porta do porão no fim da noite, mas é que os cachorros estavam em maioria e acabavam comendo a maior parte.

Pergunta: É verdade que a Cásper Líbero é uma grande faculdade de Comunicação Social?
R: Mas é claro, por que a dúvida? Inclusive quando eu comprar um buldogão velho, faço questão que ele seja adestrado por certos profissionais da casa.

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

BATMACUMBA E Ê, BATMACUMBA Ê A


E o prêmio Gilberto Gil para a frase mais Gilberto Gil de 2006 vai para... o Ministro da Cultura Gilberto Gil, que cunhou a seguinte sentença no Estadão de sábado:

- Eu tô conversando com o presidente. O processo da vida é assim mesmo, porque o dia de amanhã não é o de hoje, tem de ser feito com o hoje, mas também com o que não está posto hoje. Ao mesmo tempo há o limite da máquina governamental, da máquina do mundo. Há tudo, muita coisa. É muito lúdico também, mas não é uma brincadeira.

Acredita-se que o ministro queira dizer absolutamente nada.

domingo, 10 de dezembro de 2006

A HISTÓRIA SE REPETE COMO FARSA

Santiago do Chile, 11 de setembro de 1973. Caos na cidade. As tropas do Ministro do Exército Augusto Pinochet tomaram as ruas e cercaram o Palácio de La Moneda, onde o presidente Salvador Allende está com seus últimos assessores. Os militares ganharam a batalha. Aos poucos, Allende pede para que seus amigos o deixem só no palácio. A partir daí existem duas versões para o que ocorreu: 1) Allende pegou a arma que ganhou de presente de Fidel Castro e cometeu suicídio, e: 2) Os gorilas de Pinochet invadiram o local e assassinaram o presidente democraticamente eleito.

Não é possível afirmar qual das hipóteses é a verdadeira. Certo mesmo só o fato de que, comunicado da morte de Salvador Allende após quase um dia de resistência, Pinochet declarou: "Limpem o palácio. Até pra morrer esse filhodaputa dá trabalho".

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São Paulo, 10 de dezembro de 2006. Um plantonista de um site chega mais cedo ao trabalho para resolver algumas das mil e quinhentas questões pendentes que ele tem para resolver até o fim da semana. Ao chegar no recinto, ele descobre que o ex-ditador chileno Augusto Pinochet resolveu acertar as contas com o Além. Não é possível afirmar qual a pena que o ex-ditador terá que cumprir no limbo. Certo mesmo apenas o fato de que o plantonista em questão enxugou o suor na testa e declarou: "91 anos de vida e ele vai morrer justo no meu plantão. Até pra morrer esse filhodaputa dá trabalho".

* Foto: Bolha de S. Paulo

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

UM POST PRETENSIOSO, OU TUDO AQUILO QUE NIETZSCHE TERIA DITO SE PARASSE DE TENTAR COMER A PRÓPRIA IRMÃ


O opressor vive dentro do oprimido, disse certa vez o amigo ovino e folhudo Leandro Garfunkel Beguoci. Lembro que, quando criança, ensinei os dois dóceis cachorros de minha vizinha a abocanhar uma das galinhas que habitavam o quintal dela. Não me passava pela cabeça a hipótese de que o galináceo fosse um substituto em potencial do Frolic. Apenas pensei que seria legal os cachorros levarem as galinhas pela boca a passear por aí, vejam só que menino simpático eu era. Pois bem, os cachorros pegaram gosto pela coisa e acabaram comendo as duas galinhas do quintal em menos de 48 horas, e, logo a seguir, caçaram dois gatos da vizinhança, se é que minhas sinapses ainda estão conectando corretamente as informações da zona mais empoeirada da memória.

A cena que ficou comigo foi a visão da primeira vítima, uma galinha marrom, agonizando perto do porão, e um dos cachorros, com a cara meiga de sempre, lambuzada de sangue a abanar o rabo sôfrego para mim, com cara de missão cumprida.

Talvez a tênue linha que separar o opressor do oprimido seja a mesma de tantas outras linhas que separam opostos dentro de um mesmo alguém. O conceito de vencedor e perdedor, por exemplo. Já me passei por perdedor dezenas de vezes. As pessoas com quem convivo todas um dia foram perdedores. Aposto um dedo do meu office-boy Felipe Corizza se quem está lendo isso já não se considerou um derrotado, donde conclui-se que os vencedores não existem ou vivem todos a cavalgar pelo Mundo de Marlboro.

Aos 15 anos deixei a escola pública para fazer o colegial nesta entidade mística chamada Colégio Objetivo. A única vantagem de lá era a farta quantidade de mulheres bonitas - ou, como diria Maurício Savarese, existem duas coisas que a burguesia saber fazer: dinheiro e filhas.
Todo santo dia meu pai até lá me levava num Fusca verde 65 caindo aos pedaços, carro que é o xodó dele até hoje (sempre digo que, ao morrer, Papai Vives vai escrever no testamento: "Deixo meus quatro filhos para meu Fusca verde 65"). Pois bem, além da segunda marcha quase nunca engatar na primeira tentativa, o fusqueta tinha (e tem) mais um rude defeito: ao fechar a porta do passageiro, a portinhola do porta-luvas abre, fazendo o maior escarcéu.Tamanha era a vergonha que todo dia pedia para meu pai me deixar na quadra anterior ao colégio, para que não me vissem saindo de um besouro verde e velho cujo porta-luvas se abria ao fechar a porta.
Não guardo tanto remorso disso, eu tinha 15 anos. Um belo dia você acorda maduro o bastante para, poxa, finalmente entender que o seu pai foi bancário e professor de segundo grau depois de ter tido toda a chance do mundo de virar analfabeto quando criança, destino de boa parte dos que cresceram junto com ele. Logo, não seria o Fusca verde 65 que o transformaria em um derrotado.

Foi essa a história que lembrei ao sair do cinema depois de assistir Pequena Miss Sunshine, que já está para sair de cartaz. Ao que parece, todo mundo que assiste ao filme se lembra de alguma história similar da própria família, já que, pela primeira vez desde que freqüento cinema, o público aplaudiu ao fim da sessão como se fosse uma peça de teatro.

Do filme em si não digo nada. Qualquer comentário que fizer pode estragar o prazer de assistí-lo. E fica a certeza de que é preciso se permitir perder para ser um vencedor, seja lá o que isso queira dizer pra cada um. É isso que vai dar a dosagem entre o opressor e o oprimido dentro desse bicho estranho chamado ser humano.

Posta a conclusão que se fecha com o primeiro parágrafo tal qual redação de segundo grau, voltemos com a programação normal deste que é um blogue másculo e durão.