quarta-feira, 28 de julho de 2004

PÂNICO NO METRÔ

Loucura. Insensatez. Estado inevitável. Embalagem de iogurte inviolável. Em uma fria noite de sexta-feira de julho, um personagem em questão desceu a escada rolante do metrô da Sé, que dá acesso à linha Jabaquara-Tucuruvi. Olhar compenetrado, passos rápidos levando sua enorme mala verde nos ombros até a faixa amarela que separa seus pés 46/47 da morte. Metrô é meio, uma aconchegante cama quente em Jundiaí é fim. 
Mas antes de chegar na faixa, sua mala escorrega pelo ombro direito. O personagem em questão então utiliza sua mão esquerda para ajeitá-la. Mas ele não pressente o que estava por vir. Após o ato de ajeitar a mala, sua mão esquerda volta para o lugar de origem. Foi quando ela encontrou pelo caminho uma massa fofa e cabeluda: 

- PLOFT! 

Foi o que os populares costumam chamar de uma autêntica "bolacha". Ao olhar para ver o que sua mão esquerda vitimou, o personagem em questão observa, pasmo, o que parecia ser uma garotinha de seis ou sete anos de idade caída dois metros longe, com as mãos abertas e a cara no chão. No instante imediatamente após o "ploft", as cerca de duzentas pessoas que estavam no fatídico local, incluindo a mãe da garotinha, calaram-se e viraram seus respectivos olhares para a menina no chão, a mão esquerda do personagem em questão e sua cara pasma. Estrondoso silêncio. 

- MANHÊÊÊÊ!!!!! O MOÇO GRANDE BATEU NI MIM!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! BUÁÁÁÁÁAÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁ!!!!!!!!!!!!!!!!!! 

Gotas de suor se precipitaram na testa do personagem em questão: 

- Eu!? 

Pânico no metrô. Nosso anti-herói se vê com duzentos olhares carnífices apontados para si. Sim, para ele, o ogro assassino, o yet infanticida, o esbofeteador de bochechas rosadas. Flashes de sua vida começaram a pipocar por sua mente. Imagens dele ainda criancinha, feliz, sorridente, época em que nenhum moço grande esbofeteava suas bochechas. O personagem em questão então se sente como um Hermann Göring no Tribunal de Nüremberg, diante dos olhares de seus algozes e do juiz. Sim, havia um juiz ali no metrô naquele momento. É quando sua vista se desembaralha e ele se pega defronte à mãe da garotinha, na espera da sentença final: 

- Foi nada, menina. É você que não olha por onde anda. Levanta e vamo embora. 

Se todos os anjos do Paraíso tocassem simultaneamente suas trombetas, nem assim o personagem em questão conseguiria demonstrar sua sensação de alívio. Os olhares se dissiparam, e de vilão ele passou a ser novamente um ilustre desconhecido. Sua cama em Jundiaí nunca cumpriria tão bem seu papel como naquela noite. 

Os cães ladram, mas a caravana passa. 

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