quarta-feira, 15 de agosto de 2007

PEQUENA HOMENAGEM

Há pouco mais de cinco anos, tive uma infecção crônica em um dos joelhos que só não me tornou deficiente físico talvez por conta da piedade divina. Passei 44 dias dentro de um quarto de hospital absorto por uma rotina de antibióticos, exames, cirurgias e a certeza de que provavelmente não voltaria mais a andar direito.

Nessas horas algumas coisas pesam. Durante estes 44 dias, por exemplo, minha mãe esteve internada comigo. Não quis dormir nenhuma noite fora do hospital, não admitia deixar o filho sozinho numa situação daquelas. Era ela quem me ajudava a tomar banho, a comer, a pegar a comadre durante a madrugada e qualquer outra coisa que eu precisasse. Não adiantava insistir para ela dormir alguma noite fora de lá, em casa ou em algum lugar mais confortável. Ela simplesmente não conseguia. Foram 44 dias em que minha mãe viveu junto comigo, emagreceu junto comigo, dias em que eu via as minhas olheiras de cansaço estampadas nas olheiras dela.

Dois anos depois, fui a uma consulta definitiva ao médico que me tratou. O diagnóstico foi de happy end de final de novela: recuperação muito acima da média, caso para relatar aos alunos dele na faculdade como "exemplar", segundo as palavras dele. Naquele mesmo dia voltei para a província. Confesso que não ligava mais para toda aquela história - uma das maneiras de deixar de pensar nas merdas que ocorrem com a gente é minimizá-las ao ponto de quase esquecê-las.

Em casa, lembro que sentei no sofá com uma caneca de chá ou leite na mão. Minha mãe estava sentada na poltrona ao lado. Entre outros assuntos, disse que tinha voltado ao médico e contei que ele se assustara com a recuperação tão boa. Lembro que ela só disse "Que bom", e imediatamente abriu a comporta de um rio de lágrimas que eu não imaginava mais que estivessem represadas ali dentro. "Se você soubesse o quanto eu rezei para um dia ouvir isso...", disse ela, soluçando, mas soluçando mesmo. Pelo que me lembre, minha única reação foi abraçá-la e não dizer nada. Acho que não teria o que dizer.

Antes do incidente do joelho, era normal a gente brigar, dessas brigazinhas bestas que pais e filhos têm todos os dias. Depois daquilo, nunca mais tivemos meio desentendimento.

Nesta terça-feira minha mãe fez 58 anos. Para comemorar, no sábado quis trazê-la da província para passear em São Paulo. Almoçamos num restaurante alemão e passamos a tarde juntos falando besteira. Me diverti bastante, mas o importante era que ela se divertisse mais. E ela voltou pra casa feliz. Minha mãe é uma pessoa simples que age muito mais com o coração do que a razão. É dessas pessoas que mantêm o otimismo latente mesmo quando tudo insiste em dar errado.

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