quinta-feira, 29 de setembro de 2005

ESBOÇO DE ROTEIRO PARA CURTA-METRAGEM DE QUALIDADE DUVIDOSA

Tomada 1: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. Uma delas muge.

Tomada 2: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. A outra delas muge.

Tomada 3: Vácuo de som, vácuo de ar. Uma luz resplancedente toma de assalto o recinto.

Tomada 4: FERNANDO VIVES!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Tomada 5: Luz some, ambiente volta ao normal.

Tomada 6: Duas vaquinhas param de pastar e entreolham-se. Vaquinha 1 levanta as sobrancelhas.

Tomada 7: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. Ambas se recusam a mugir.

Tomada 8: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica. Silêncio.

Tomada 9: Duas vaquinhas pastam pelo campo em cena bucólica.

FIM DO ROLO

quarta-feira, 28 de setembro de 2005

O JORNAL E SUAS METAMORFOSES

Um senhor pega um bonde depois de comprar o jornal e pô-lo debaixo do braço.

Meia hora depois, desce com o mesmo jornal debaixo do mesmo braço. Mas já não é o mesmo jornal, agora é um monte de folhas impressas que o senhor abandona num banco de praça.

Mal fica sozinho na praça, o monte de folhas impressas se transforma outra vez em jornal, até que um rapaz o descobre, o lê, e o deixa transformado num monte de folhas impressas.

Mal fica sozinho no banco, o monte de folhas impressas se transforma outra vez em jornal, até que uma velha o encontra, o lê e o deixa transformado num monte de folhas impressas. Depois, leva-o para casa e no caminho e aproveita-o para embrulhar um molho de acelga, que é para o que servem os jornais depois dessas excitantes metamorfoses.

*de Histórias de Cronópios e de Famas, Julio Cortazar.

VERÁS QUE UM FILHO TEU NÃO FOGE ÀS PINGAS

Voltei

Foi ao observar vaquinhas coloridas pela Paulista que mais uma vez encontrei uma criança debaixo de meu pé direito e resolvi voltar a blogar. A vítima da vez era de ascendência japonesa e não tinha mais que sete primaveras, tendo desgarrado-se dos braços orientais da mãe apenas três passos antes de virar piche sob minha sola 47. Enquanto a progenitora esgoelava, concluí abstraidamente que o infanticídio involuntário já é tradição nestes 24 verões de existência, tanto quanto escrever neste hebdomadário virtual. Logo, entre acabá-lo de vez e voltar a enchê-lo de palavras nauseantes contra o PSDB, a Cásper Líbero ou a mãe do Corizza, optei por esta última.

Mas a dúvida que me pegou entre o fígado e a alma é: o que escrever? O fígado me deu a resposta antes da alma. Sábado passado, ao acordar de sonhos intranqüilos, o editor de SorryPeriferia pegou-se em apartamento estranho debruçado sobre um vaso sanitário de cor roxa (ou seria vinho?). Ele sabia que não devia misturar cerveja excessiva, uma garrafa de Almadén e caldinho de sururú, além do famoso cigarro que passarinho não fuma, mas resolveu pagar para ver. O resultado da nauseabunda miscigenação alcoólica foi parar no supra-citado vaso cor vinho (ou seria verde-musgo?) ao som de Paulinho da Viola que vinha da sala. A cada frase de Foi um rio que passou em minha vida, um pouco de minha dignidade se deixou levar tubulação adentro.

Agora, devidamente recuperado de tamanha falácia etílica, incubo-me da tarefa de soerguer a moral utilizando-me deste blog.

Vão-se os porres, mas o fígado fica.

Voltei.


(em breve: novo lay-out)

sexta-feira, 9 de setembro de 2005

FALANDO MACIO E CARREGANDO UM GRANDE PORRETE

Particularmente não simpatizo com cinderelas. Todas as cinderelas que conheci em vida se transformaram em abóbora à meia-noite. Prefiro muito mais uma mulher que aperte minhas bochechas e diga "Gosto de ti, mas saiba que também prefiro as putas". Nunca de alguma maluca que se aconchegue em platonices canastronas.

Penso também que príncipes encantados acabaram junto com a monarquia. Se você não conseguiu achar meia dúzia de homens da sua vida andando uma hora por dia pela Praça da Sé, o problema é com você, não com a humanidade. A recíproca também é verdadeira: mais chato que uma cinderela só mesmo um cinderelo. Casimiro de Abreu foi um sujeito muito chato.

No fundo a cinderelice é o anti-romantismo. Não enxerga quem não quer. Como o Antônio Abujamra sempre repete: a vida não dá presente a ninguém. Se você quer uma vida, aprenda a roubá-la.