Hugo Chavez, em pose Nacional Kid
Perguntam minha opinião sobre a canetada do Hugo Chavez, que deixou o povo venezuelano mais triste por não poder mais assistir as novelas da RCTV no horário nobre. Na verdade ninguém perguntou porra nenhuma, mas eu precisava começar o texto de uma maneira glamourosa. Não me aborreçam.
Primeiro, a CartaCapital da semana passada (não está mais nas bancas, me desculpem) veio com quatro ou cinco matérias de fôlego a comentar a influência da mídia na Venezuela, no Brasil, na França e nos States. Não concordo muito quanto ao que diz o texto sobre a crise do Renan Calheiros - o senador que engravidou uma "maria emenda", versão política das "marias chuteiras" que infestam os treinos dos clubes de futebol - mas o restante das análises poderiam ser bem utilizadas nas faculdades de jornalismo.
A questão é a seguinte: Hugo Chavez sofreu um golpe de estado em 2002, que teve apoio descarado da RCTV (acho que não preciso lembrar o ilustre leitor de que golpes de estado não faz parte da constituição de país algum). Assim que prenderam o presidente venezuelano, a tal emissora teceu loas ao novo governo. Mas, por uma série de detalhes que não vêm ao caso, Chavez iniciou um processo de retomada do poder que durou algumas horas, período o qual a RCTV não deu um mísero escasso boletim sobre a situação política do país. E, após a retomada do poder constitucional, a emissora foi tão simpática a ele quanto um oficial alemão dos anos 30 era para um judeu.
Há algum tempo atrás, conheci no bar alguém que visitou a Venezuela recentemente - não consigo lembrar quem era, provavelmente eu estava bêbado. Essa pessoa (acho que era mulher. Já é um começo) disse que a dita rede transmitia jornais em horários nobres com entrevistas com psicólogos que tentavam provar que Hugo Chavez tem problemas mentais sérios, e daí pra baixo (ai do Lula se a Veja descobre essa tática...).
Logo, a fronteira entre fazer oposição e incentivar o golpismo foi ultrapassada há muito tempo. A RCTV quer derrubar o governo de qualquer jeito, e não se deve renovar uma concessão pública a quem não aceita um governo legal vigente e o combate como se fosse uma guerra. Como bem lembrou a análise da revista, se fosse uma emissora de TV dos Estados Unidos que promovesse um golpe militar, teria sua concessão cassada na hora, sem grande furor.
Hugo Chavez tem lá seus problemas. Herdou alguns defeitos de Fidel Castro, fala demais e dá clara indicações de que pretende permanecer no poder por muito tempo. Porém, é o que de melhor ocorreu na Venezuela desde os tempos em que Bolívar dançava merengue na fronteira com as Guianas.
Agora, que a imprensa brasileira ia baixar o cacete no cancelamento da concessão você já sabe, sobretudo os donos dos veículos de comunicação, através de seus jornalistas favoritos. Mas o mais absurdo de tudo isso é ver os Repórteres sem Fronteiras se declararem contra o cancelamento da concessão. Mino Carta sempre diz que o Brasil é o único país do mundo em que jornalista chama patrão de colega. Pelo visto, o editorial dos Repórteres Sem Fronteira corrige o jornalista, provando que, além de não estarmos sozinhos na proliferação da cólera, malária, tuberculose e grande elenco de problemas sanitários, fomos pioneiros também na globalização de jornalistas puxa-sacos.